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Mulheres relatam humilhações no trabalho após ficarem grávidas

CLT garante estabilidade às gestantes até o quarto mês e, por isso, patrões forçam situações para que as mulheres peçam para sair

Economia|Thais Skodowski, do R7

Salário atrasado e assédio moral são alguns exemplos
Salário atrasado e assédio moral são alguns exemplos Salário atrasado e assédio moral são alguns exemplos

Quando Mariana*, 29 anos, voltou das férias, teve duas surpresas: que estava grávida e que não era mais bem-vinda no ambiente de trabalho. Em uma tentativa de forçá-la a pedir demissão, já que a CLT garante estabilidades às gestantes, a empregada doméstica foi humilhada até o nono mês de gravidez.

Primeiro, a mudaram de local de trabalho. Antes, limpava a casa da patroa. Já grávida, foi transferida para ser faxineira da empresa da família. Nem mesmo a diabetes gestacional foi motivo para que ela fosse poupada do serviço pesado.

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“Eu trabalhava fazendo serviço pesado, mesmo não podendo porque eu tinha sofrido uma ameaça de aborto. Ela [a patroa] proibia as pessoas de falarem comigo. Tinha até uma outra faxineira lá, ela não deixava a gente conversar, nem almoçar no mesmo horário, era para almoçar em horário diferente porque não queria conversa”, diz.

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Mas não era só isso. Mariana conta que tinha pagamento atrasado de propósito, e até mesmo o suco que ela tomava no refeitório era motivo para implicância.

“Muitas vezes eu voltei para casa chorando, eu me sentia humilhada. É um momento em que a gente fica mais frágil, e ela não teve um pingo de consideração”, comenta.

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Mariana pediu a licença-maternidade semanas antes do esperado, porque não aguentava mais. Quando voltou, fez um acordo e saiu do emprego.

Fernanda*, 28 anos, também passou a ser constrangida no trabalho após informar que estava grávida. Após seis meses exercendo a função de auxiliar de limpeza em uma lanchonete, viu o emprego que até então era “tranquilo” virar um pesadelo.

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“A esposa do dono da lanchonete me criticava bastante. Dizia que não tinha mandado eu engravidar”, conta.

A funcionária limpava um salão inteiro, arrastava mesas e cadeiras. A situação chegou ao ponto que Fernanda passou mal e foi parar na UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Ficou uma semana internada. Após o nascimento da filha, pediu demissão.

Represálias

Atendente há mais de um ano em uma rede de fast food, Patrícia*, 28 anos, levou um atestado médico para mostrar ao gerente que não poderia ficar em pé por muito tempo por causa da gravidez. A situação até foi acatada, mas com represálias.

Patrícia precisava pegar uma cadeira da praça de alimentação do shopping para ficar sentada. Porém, quando saía de perto, a cadeira era retirada de propósito. Além do desdém dos colegas, ouviu palavrões do próprio supervisor, foi trocada de horário e até lugar de trabalho.

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“Assim que comuniquei que estava grávida, me mandaram para um local onde fritam os hambúrgueres. Mas era muito quente lá, eu não aguentava”, diz.

Patrícia, que ainda não teve o bebê, pretende sair do emprego assim que a licença-maternidade acabar.

Com Bruna*, 31 anos, a situação não foi diferente. Ela começou em dezembro a trabalhar em uma lan house e, em março, descobriu que estava grávida. Por isso, ouviu inúmeras indiretas e chacotas do empregador.

“Eu tinha amizade com basicamente todos os funcionários, porque eu acabei treinando a maioria, e todos contaram que ele [o patrão] estava frustrado, porque para ele eu havia engravidado de propósito. Ele achava que eu tinha entrado na loja com o intuito de engravidar para pegar licença-maternidade”, relata.

Ainda de acordo com Bruna, uma outra funcionária contou que o empregador já tinha pressionado outra colega gestante a pedir demissão. Durante o tempo em que esteve na loja, o patrão fazia questão de mostrar o descontentamento.

Assim que voltou ao trabalho, após o nascimento do filho, Bruna foi demitida. Ela ainda ouviu que o fato de ter engravidado “foi uma traição de confiança”. À época, decidiu não entrar na Justiça contra o patrão.

Demissão em até dois anos

As histórias de Mariana, Fernanda, Patrícia e Bruna se repetem em todo o Brasil. Em uma pesquisa rápida em grupos de gestantes em redes sociais, são vários os relatos de mulheres que sofrem humilhações após informar que estão grávidas.

A violência, no entanto, segue após o parto. Uma pesquisa da FGV (Fundação Getúlio Vargas), de 2017, realizada com 247 mil mulheres, entre 25 a 35 anos, mostrou que a metade das mulheres que tiveram filhos perdeu o emprego até dois anos depois da licença-maternidade. A probabilidade de demissão chega a 10% no segundo mês após o retorno do trabalho.

Dados estatísticos dão a dimensão do quanto o mercado de trabalho é cruel para mulheres com filhos. De acordo com o levantamento do SPC Brasil, 59% dos desempregados brasileiros são mulheres com média de 35 anos e 58% com filhos. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Brasil tem 12,7 milhões de desempregados.

Lei Trabalhista

A advogada trabalhista Clarisse Souza Rozales, sócia do escritório Andrade Maia, afirma que, segundo a lei, a grávida tem a proteção do emprego desde a concepção até o período de quatro meses após o nascimento da criança.

“No momento em que ela ficou grávida, ela não pode ser demitida, exceto por justa causa”, disse. “O que às vezes acontece, infelizmente, é que os patrões forçam essa saída por causa do estado gravídico”, complementa.

De acordo com Clarisse, nesses casos, a grávida tem duas opções: entrar em contato com o sindicato da categoria para que ele notifique a empresa ou ajuizar uma ação contra o patrão, mesmo ainda estando empregada.

Ainda segundo a advogada, em casos de trabalhos insalubres, é importante que a gestante consiga um laudo médico mostrando que ela não pode realizar a função.

“As questões de insalubridade e periculosidade foram bastante discutidas na Reforma Trabalhista. Ela garante o afastamento no caso máximo, as demais dependem de um laudo médico. É um discurso que está sob análise”, comenta.

*A pedido das entrevistadas, o R7 alterou os nomes para esta reportagem.

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