Videla comemorava gols da Argentina a metros de um campo de concentração
Internacional|Do R7
Enrique Escande. Buenos Aires, 17 mai (EFE).- O ditador Jorge Rafael Videla comemorava com entusiasmo os gols da Argentina contra a Holanda na final da Copa do Mundo de 1978 no estádio Monumental, a menos de mil metros de um campo de concentração onde as Forças Armadas torturavam e matavam argentinos. A feição transtornada de seu rosto perante um gol marcado pela seleção argentina ficou gravada nas páginas mais tristes da história do esporte mais popular de seu país. Videla não dava a mínima ao futebol, mas naquela época o utilizou para criar uma imagem falsa de uma suposta alegria popular por um título e dar a entender que não existiam preocupações com outros assuntos. "Os argentinos somos direitos e humanos", insistiam os anúncios da ditadura enquanto seus líderes, o general do Exército Videla, o chefe da Marinha, almirante Eduardo Emilio Massera, e o da Força Aérea, brigadeiro Aérea Orlando Agosti, decidiam quem tinha ou não direito à vida. O estádio Monumental, o principal dos seis palcos do Mundial de 78, está situado muito perto da Escola de Mecânica da Marinha, o maior centro clandestino de detenção, tortura e morte daqueles anos. São menos de oito minutos de caminhada. Uma distância suficiente para que o eco do grito de uma multidão fosse escutado com clareza em celas escuras e salas de torturas, em recintos onde pariam seus filhos mulheres detidas e posteriormente desaparecidas. Nesse buraco da Marinha de Guerra onde milhares de jovens foram instruídos para torturar e matar, tudo isso era levado à prática enquanto a seleção argentina superava a Holanda por 3 a 1 em 90 minutos de jogo e mais 30 de prorrogação. Videla achou que a encenação era perfeita. Que tudo tinha saído bem. Que tinha dado um exemplo ao mundo de harmonia e paz em um país que as Forças Armadas estavam "reorganizando". Não foi bem assim: foi condenado à prisão perpétua por crimes de lesa-humanidade. Chegou a ser indultado, mas os processos foram reabertos na Justiça, foi condenado novamente e passou parte de sua vida na prisão, onde morreu em uma cela hoje os 87 anos. Desde aquela final com a Holanda disputada no dia 25 de junho de 1978, Videla não voltou a pisar em um estádio. Não se importava com o futebol e tampouco com as vidas dos 30 mil desaparecidos durante a ditadura que liderou a partir do golpe de 1976 e que terminou com outros hierarcas militares em 1983, quando enfim voltou a democracia. EFE ee/rsd