Furna da Onça: pagamentos de propina ocorreram dentro da Alerj
“Pacotes de vantagens”, incluindo mesadas e cargos, foram oferecidos a parlamentares para atender interesses de Cabral, segundo PF e MPF
Rio de Janeiro|Bruna Oliveira, do R7
As investigações da Operação Furna da Onça apontam que “pacotes de vantagens”, incluindo mesadas e cargos dentro da máquina pública, foram oferecidos a deputados estaduais do Rio de Janeiro com objetivo de atender aos interesses da organização criminosa comandada pelo ex-governador Sérgio Cabral, especialmente no segundo mandato dele, entre os anos de 2011 e 2014, de acordo com a Polícia Federal e o MPF (Ministério Público Federal). Há informações, inclusive, de que pagamentos de propinas ocorreram até nas dependências da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
MPF investiga se esquema da Alerj destinou R$ 3 mi à Mangueira
O esquema de corrupção movimentou cerca de R$ 54,5 milhões em quatro anos, com pagamentos mensais para ao menos 10 parlamentares que tiveram a prisão decretada pela Justiça nesta quinta-feira (8).
O procurador da República Carlos Aguiar afirmou que a organização criminosa fazia o dinheiro chegar até os agentes corrompidos por meio de doleiros. Eles, por sua vez, tinham uma “dinâmica flexível” para a entrega dos recursos, que eram feitos em escritórios privados, residências e também dentro da Alerj.
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De acordo com a delegada da PF Xênia Soares, além de mesadas, cargos no Detran-RJ (Departamento de Trânsito do Rio de Janeiro) também foram oferecidos como moeda de troca.
“Os cargos eram uma outra vantagem no pacote de benefícios ofertados para esses parlamentares. Esses cargos geravam uma repercussão política para eles que era importante. Normalmente, eram nas áreas de atuação política de influência. Marcos Abrahão, por exemplo, dominava o posto do Detran no município de Rio Bonito, que é onde ele tem uma forte atuação política. Normalmente, o parlamentar tinha preferência para dominar o posto da área política onde tinha ascensão”.
Ainda segundo Aguiar, o esquema tinha como objetivo dar apoio e suporte aos interesses do grupo de Cabral em votações de projetos de lei e contra o avanço de CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito).
“Existe um feudo dentro do Rio. Esses políticos se valem da força política para viabilizar os projetos de poder de cada qual, isso como forma de garantir os interesses da organização criminosa muitas vezes transformados em apoio a projetos do governo e iniciativas que pudessem provocar embaraço ao governo, como a CPI última que se tentou fazer em torno da Fetranspor. Enfim, identificamos diversos movimentos praticados ao longo da atividade parlamentar que se traduziram nessa contrapartida para aproveitamento desses cargos”.
Operação Furna da Onça
Policiais federais cumpriram 22 mandados de prisão e 47 de busca e apreensão expedidos pelo TRF2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) na manhã desta quinta-feira. Entre os alvos estão deputados estaduais, o presidente do Detran/RJ (Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro), Leonardo Silva Jacob, e um secretário do governo de Luiz Fernando Pezão (MDB), Affonso Monnerat.
De acordo com a PF e o MPF, informações obtidas com o doleiro e delator Carlos Miranda, considerado braço direito do ex-governador Sérgio Cabral, levou à descoberta de um esquema de corrupção, desvio de verbas e loteamento de cargos públicos dentro do Detran/RJ e outros órgãos da administração estadual.
Segundo as investigações, a propina resultava do sobrepreço de contratos estaduais e federais. Além de Cabral, tinham função de comando na organização investigada os ex-presidentes da Alerj Jorge Picciani e Paulo Melo, presos antes na Operação Cadeia Velha e com novas ordens de prisão.
Defesas
O governo do Rio de Janeiro, procurado pelo R7 para falar sobre o envolvimento de Monnerat na operação, afirma que "desconhece os fatos e não teve acesso aos autos do processo".
O Detran-RJ diz que está "à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento". O R7 não conseguiu contato com a defesa de Leonardo Silva Jacob e Vinícius Farah.
A defesa de Vinícius Farah disse que ele "confia na Justiça e afirma que a situação será devidamente elucidada. Ele já se apresentou às autoridades em Brasília para os devidos esclarecimentos. Ele estava na cidade para agenda de trabalho".
A assessoria de imprensa do deputado Chiquinho da Mangueira afirma que as acusações são infundadas e que os trabalhos no barracão da escola de samba continuam normalmente. A escola de samba Mangueira repassou o mesmo comunicado à reportagem.
O deputado André Corrêa publicou em seu perfil em uma rede social a seguinte mensagem: "Deus no controle sempre. Nunca envergonhei vocês. Confio na justiça do meu Estado e do meu País. Quem não deve não teme. Lamento que no momento que 44 deputados assinam um compromisso com minha candidatura à Alerj isto aconteça. Repito que estou tranquilo. Quem me conhece sabe meu modo de agir. Continuarei de cabeça erguida. Não tenho sequer advogado. Confio em Deus".
Em nota, a defesa do deputado Edson Albertassi disse que o parlamentar nunca participou de qualquer ato criminoso durante seus mandatos e reafirma sua inocência. “O Ministério Público Federal transformou a persecução penal em uma ação sem critério lógico. como se fosse uma loteria. Ressaltamos que o deputado Edson Albertassi nunca participou de qualquer ato criminoso durante seus mandatos e reafirma sua inocência”.
A assessoria de comunicação do deputado Marcus Vinícius Neskau (PTB) afirma que o parlamentar "recebeu a ordem de prisão temporária com muita indignação e estranheza, justo em um período de articulações políticas sobre a votação para a próxima composição da Presidência da Alerj – onde o deputado já havia se manifestado pelo voto a favor do deputado André Corrêa. No entanto, o parlamentar segue seu compromisso com a população de dar transparência a seu mandato, afirmando sua inocência e colaborando com todas as investigações, prestando todos os esclarecimentos à Polícia Federal, Ministério Público e Justiça".
O gabinete do deputado Coronel Jairo não se posicionou sobre as ações da operação Furna da Onça. O R7 falou com as equipes de Martins e Melo e aguarda posicionamento oficial.
A reportagem não conseguiu contato com a assessoria de imprensa ou defesa de Picciani, Simão e Abrahão.