R7 visita cadeia feminina e vê de perto o drama das mães que amamentam atrás das grades. Assista
Mulheres ficam local reservado com cartazes educativos e imagens de bichinhos infantis
São Paulo|Do R7*
São Paulo tem 130 mulheres grávidas e outras 83 que amamentam (lactantes) dentro das 22 unidades prisionais do Estado, segundo a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária). Deste total, 35 delas cumprem pena no Pavilhão Materno Infantil da PFC (Penitenciária Feminina da Capital — Carandiru), localizada na zona norte de São Paulo.
A reportagem do R7 visitou o local e conversou com detentas sobre a maternidade durante o encarceramento (assista ao vídeo abaixo). Até o dia 15 de março, a população total da penitenciária era de 635 mulheres, contando tanto o pavilhão materno como a área de presas comuns. A capacidade total do presídio é de 604 mulheres.
Antônia Patrícia de Macedo Mendes, Alexandra Moisés e Gabriela Andrade Santana são três exemplos de mães que amamentam e cumprem pena dentro do Pavilhão Materno da PFC — as três são mães de bebês de 4 meses de idade, os quais, aos 6 meses, deverão deixar o presídio para o convívio familiar fora da cadeia.
O ambiente da cadeia destinado às lactantes é decorado para torná-lo menos hostil, principalmente para as crianças. As paredes, pintadas de azul claro e branco por causa das cores do logo da SAP, têm papéis colados que explicam sobre amamentação e cuidados com o bebê, além de imagens de bichinhos infantis e placas coloridas. Afinal, é dentro desta construção, de dois andares, que os bebês têm as primeiras experiências de vida.
Para as detentas, o Pavilhão Materno não se parece tanto com a área habitacional de outras prisões. Umas das principais diferenças é que elas não são trancadas nas celas durante a noite. O pavilhão tem apenas as trancas das áreas de convivência, além do portão principal.
Assim como mulher de Cabral, milhares de presas poderiam estar fora da cadeia
Alexandra chegou na PFC depois de dar à luz Miguel e contou que, durante a gestação, na Penitenciária Feminina de Sant’Ana, dividiu cela com uma companheira. Lá, as mulheres grávidas não possuíam um espaço exclusivo.
— Eu tinha uma parceira que cuidava de mim, não deixava eu fazer nada errado, me paparicava. Se não fosse ela eu ficava mais desesperada. Depois de 14 anos, ter um filho novo foi uma novidade.
As celas individuais eram um sonho para Antônia, de 29 anos, que passou toda a gestação dividindo o espaço com cerca de 20 mulheres. Na época, a detenta estava na Penitenciária Feminina de Campinas. Foi detida em flagrante por tráfico de drogas e diz esperar deixar a prisão junto com a filha, em maio.
— Éramos em 12 mulheres, fora as que dormiam no chão. No total éramos 20.
Na PFC existem dois tipos de celas: coletivas, localizadas no andar térreo da construção, onde as presas ficam durante os primeiros dias de chegada na penitenciária e as individuais, espaço para o qual podem ser transferidas ao passarem confiança para as agentes da prisão. A primeira delas está equipada com alguns berços e uma espécie de mesa onde as mães podem colocar os pertences dos bebês. Mas não há camas.
O chão cinza das celas individuais contrastam com as paredes pintadas de branco. Cada uma delas tem uma cama e um berço. Ao passar pelo corredor das celas, as portas abertas deixam à mostra a personalidade das presas. A maioria delas decora o ambiente com fotos e utensílios mandados por meio do “jumbo” — nome da sacola de materiais enviada pelas família das presas a cada 15 dias.
Convivendo com as ‘mãezinhas’
Na PFC, as detentas dividem o dia a dia apenas com gestantes, lactantes e com as agentes penitenciárias — todas mulheres. Durante a conversa, é comum escutar as funcionárias da cadeia e as próprias presas referindo uma às outras como ‘mãezinhas’. Lá dentro, buscam uma boa convivência, principalmente para criar um ambiente saudável para os bebês.
Com a fala triste, Gabriela, de 21 anos, afirma que a rotina com as crianças torna o dia a dia “mais ou menos bom” dentro da prisão, assim como o convívio com as presas.
— Nós não conhecemos totalmente as companheiras, não sabemos de onde elas vieram ou se são de facções.
Antônia diz que a convivência é algo que aprendem todos os dias dentro da PFC e que a função das mães é se dedicar exclusivamente aos cuidados dos bebês. Alexandra complementa que o respeito é o princípio básico dentro do pavilhão, já que todas têm, além dos filhos, o mesmo desejo em comum: a liberdade.
— É uma respeitando o espaço da outra, conversando, ajudando. Às vezes eu não 'tô bem de mente', eu vou lá e converso.
‘Queriam a bolsa estourada’
Gabriela conta que o parto de Anne, sua segunda filha, teve complicações, porque o coração da bebê acelerou mais do que o normal no dia do nascimento, mas que em nenhum momento foi tratada como detenta dentro do hospital.
Porém, no caminho para o local precisou colocar as mãos para trás, abaixar a cabeça e não olhar para os lados ao chegar ao hospital.
— Na hora do parto eu tive medo, quando o médico disse que o coração dela tava acelerando. Eu tive medo dela morrer dentro da minha barriga.
Por conta dos riscos para o bebê na gravidez de Gabriela, ela foi submetida a uma cesárea. O trajeto do CDP de Franco da Rocha até o hospital Vila Penteado, na zona norte de São Paulo, onde Anne nasceu, foi realizado de ambulância e não de camburão ou escolta policial.
Ao 7º mês de gravidez, Alexandra conta que teve problemas porque Miguel estava “com pressa para nascer”. Para evitar que o bebê nascesse prematuro, recebeu alguns medicamentos. Assim como Gabriela, o parto também teve complicações e Alexandra foi submetida à cesárea, porque quando a bolsa estorou o bebê estava enrolado no cordão umbilical e havia defecado.
— Eu tava passando mal e como lá [penitenciária de Sant’Ana] não tem médico nem nada, me mandavam para o hospital, que me mandava de volta para a prisão, porque eles queriam a bolsa estourada. Quando estourou, já saíram as fezes dele [bebê].
A detenta passou a gravidez toda na Penitenciária Feminina de Sant’Ana e foi transferida para a PFC já com Miguel nos braços. Diferentemente de Anne e Miguel, Iago, filho de Antônia Patrícia, nasceu de parto normal. Mesmo que Antônia não fosse mãe de primeira viagem (já tinha três filhos fora da prisão), teve medo do momento do parto, porque sentiu muita dor.
— Foi a primeira vez que eu fui presa. Eu senti medo de ter meu filho dentro de uma prisão e não no hospital.
Exames pré-natal
As três detentas explicaram à reportagem do R7 que fizeram alguns exames durante o pré-natal. Gabriela afirma que fez exames de HIV e sífilis, além de um ultrassom. Alexandra diz ter feito quatro ultrassons. Antônia também afirma que realizou alguns exames, como ultrassons.
De acordo com a Caderneta da Gestante do Ministério da Saúde de 2016, o pré-natal ideal conta com cerca de dez exames, como hemograma, teste de HIV e exame de urina. Além disso, indica-se que a mulher faça ao menos três ultrassons, sendo um para cada trimestre da gravidez.
Por fim, existe a recomendação que a grávida tome algumas vacinas importantes. As quatro sugeridas são: antitetânica, dTpa (para evitar tétano no bebê), contra a gripe e contra a hepatite B.
Assista ao vídeo em que detentas falam sobre a relação com a família atrás das grades:
* Giuliana Saringer, estagiária do R7.