'Tempo verde' é melhor para saúde mental das crianças do que o de tela
Análise de 186 estudos concluiu que período na natureza pode compensar o tempo excessivo nas telas e melhorar o desempenho escolar
Saúde|Aline Chalet, do R7*

Uma revisão de 186 estudos descobriu que o tempo gasto em contato com a natureza pode melhorar a saúde mental e o desempenho escolar das crianças em comparação com o tempo gasto em frente às telas. O estudo foi realizado por pesquisadores australianos e publicado no periódico científico Plos One.
O tempo gasto assistindo TV, em computadores ou jogando videogame foi associado a resultados psicológicos ruins, aumento de doenças mentais, pior funcionamento cognitivo e pior desempenho acadêmico.
A pesquisadora Tassia Oswald, da Universidade de Adelaide, na Austrália, disse ao jornal britânico Daily Mail que crianças e adolescentes de baixo nível socioeconômico podem ter níveis mais altos de tempo de tela e menos acesso à natureza em seus bairros.
Segundo o jornal, as crianças de baixo nível socioeconômico não são bem representadas em estudos científicos, o que pode significar um problema ainda pior.
O artigo informa que a as doenças mentais entre crianças e adolescentes está aumentando no mundo inteiro, principalmente a depressão e a ansiedade. Esses quadros são a principal causa de redução da qualidade de vida dessa faixa etária.
Além disso, apresentar sintomas depressivos e ansiosos na infância aumentam o risco de problemas de saúde mental na idade adulta.
Os pesquisadores explicam que, com a evolução tecnológica, o tempo gasto em telas tem aumentado. Uma década atrás, uma amostra dos Estados Unidos com pessoas de 8 a 18 anos mostrou um tempo médio de 7,5 horas por dia em telas, muito mais do que as diretrizes recomendam de 2 horas ou menos por dia de uso recreativo.
Porém, com a ampla integração das tecnologias digitais nos currículos, o tempo de tela não se limita mais ao uso recreativo, tornando-se parte inevitável da vida dos jovens.
O estudo ressalta que o tempo moderado em telas pode ser benéfico, pois pode proporcionar oportunidades de melhorar relacionamentos, formar novas conexões, ajudar a explorar uma identidade, ajudar em atividades acadêmicas e oferecer informações.
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Porém, o uso pode prejudicar o desenvolvimento neurológico e ser nocivo a outras atividades importantes para a saúde mental como atividade física, sono, interações pessoais e atividades acadêmicas. Além disso, à medida que o tempo de tela aumentou o tempo em contato com a natureza diminuiu.
Na Inglaterra, menos de um quarto das crianças relatou visitar regularmente ambientes naturais e menos de uma em cada 10 disse brincar regularmente em locais selvagens, comparado com metade das crianças da geração anterior.
Os pesquisadores afirmam que ter contato com a natureza pode trazer benefícios, pois aumenta a quantidade de atividade física e conexões sociais. As áreas naturais também tendem a ser menos lotadas, o que acarreta a redução da poluição sonora e do ar.
O tempo exposto à luz solar ajuda a regular o ciclo de sono. Além disso, diversas teorias acreditam que estar em contato com a natureza pode restaurar o funcionamento cognitivo e diminuir o estresse.
Dos trabalhos analisados pelos pesquisadores, 114 eram sobre o tempo de tela, 58 sobre o tempo verde e 14 sobre ambos.
A revisão coletou resultados para crianças pequenas, abaixo de 5 anos, escolares, de 5 a 11 anos, adolescentes iniciais, de 12 a 14 anos e adolescentes mais velhos, entre 15 e 18 anos.
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Os pesquisadores concluíram que o tempo verde "amortece" as consequências de um tempo maior de tela. Dessa forma, acrescentar ambientes naturais à rotina pode ser uma política pública de saúde para melhorar o bem-estar de jovens.
“Mais pesquisas nessa direção nos ajudariam a descobrir se devemos concentrar nossos esforços na redução do tempo de tela dos jovens ou se simplesmente aumentar seu tempo verde junto com o tempo de tela já seria benéfico para o bem-estar psicológico”, afirmou a pesquisadora.
Além disso, várias das pesquisas analisadas estão focadas em formas mais antigas de tecnologia como televisão, videogames e computadores e os trabalhos realizados futuramente devem se concentrar nos efeitos para a saúde mental de tecnologias portáteis.
Os smartfones e tablets possuem uma grande variedade de aplicativos e atividades que podem ser benéficas para a saúde mental.
A professora Fame Til Wykes, especialista em psicologia do King’s College London, disse ao jornal britânico que os pais não precisam necessariamente reduzir o uso dos filhos em aparelhos. “Tudo depende do que as crianças fazem com o tempo. O que a maioria das crianças precisa é uma mistura de atividades.”
Segundo informações do Child Mind Institute, instituição de caridade norte-americana dedicada à saúde mental das crianças, as crianças que brincam ao ar livre são mais inteligentes, mais felizes, mais atenciosas e menos ansiosas do que as que passam mais tempo dentro de casa.
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Segundo o instituto, a maneira como a criança brinca na natureza requer menos estrutura do que a maioria das brincadeiras internas.
Brincar em área verde promove a criatividade e a imaginação, pois a interação com o ambiente é mais livre; ensina responsabilidade, pois a criança percebe o que acontece ao regar uma planta ou arrancar uma flor, por exemplo; fornece estímulos diferentes, pois há mais para ouvir, cheirar e tocar; faz as crianças se movimentarem mais.
O ambiente natural também faz as crianças refletirem e fazer mais perguntas sobre a terra e a vida, reduz o estresse e a fadiga, segundo as pesquisas.
*Estagiária do R7 sob supervisão de Deborah Giannini