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Tecnologia e Ciência

Entenda o que é pornografia de vingança e saiba como denunciar

Vítimas têm dificuldade em reunir provas para incriminar a pessoa responsável por compartilhar indevidamente fotos e vídeos íntimos

Tecnologia e Ciência|Sofia Pilagallo, do R7*

Episódio pode trazer severas consequências psicológicas e até físicas à vítima
Episódio pode trazer severas consequências psicológicas e até físicas à vítima

A pornografia de vingança é um crime que consiste em expor publicamente na internet fotos ou vídeos íntimos de outra pessoa sem o consentimento dela.

Desde 2018, o compartilhamento desse tipo de material é considerado um crime, de acordo com o artigo 218-C do Código Penal, e pode levar à pena de um a cinco anos de prisão, além de indenização por danos morais e materiais à vítima.

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Nos casos em que a conduta é motivada por vingança ou humilhação, ou ainda, se a pessoa que a praticou mantém ou manteve "relação íntima de afeto" com a vítima, a pena pode ser aumentada em até dois terços.

Ainda assim, são raros os casos em que os crimes de pornografia de vingança são levados à justiça. A pesquisa do "Projeto Vazou", realizada pelo Grupo de Estudos de Criminologia (GECC), divulgada em 2019, ouviu 141 vítimas e revelou que 86% delas não abriram um processo judicial.


Uma delas é Helena**, 21 anos, de Santos, no litoral de São Paulo. Há dois anos, quando estava no terceiro ano da faculdade de Direito, ela foi apresentada a Pedro**, na época com 24 anos, um amigo do namorado de sua irmã mais velha e advogado em um escritório conhecido da cidade.

"Minha irmã e o namorado dela sempre diziam que o Pedro era muito legal e que nos daríamos muito bem juntos. Tínhamos muito em comum. Começamos a 'ficar' e tivemos um relacionamento que durou cinco meses", conta.


Após esse período, eles tiveram um desentendimento e decidiram romper o relacionamento. "Achei que fosse ficar tudo bem, até porque temos a impressão de que pessoas mais velhas tendem a ser mais maduras."

Três semanas depois do término, Helena descobriu por meio de uma estagiária de Pedro que ele estava espalhando suas fotos íntimas pelo WhatsApp. A funcionária contou ter visto as fotos no celular de um colega de trabalho.


Ao ser confrontado por Helena, Pedro negou a acusação de ser responsável por enviar as imagens. "Em um primeiro momento, ele ameaçou me processar por eu tê-lo incriminado. Depois, em tom de deboche, disse que minhas provas seriam inconclusivas para a justiça e que ninguém acreditaria em mim. Fiquei devastada", lembra a vítima.

Consequências do crime

Segundo a psicóloga e sexóloga Sônia Eustáquia, a pornografia de vingança pode trazer severas consequências psicológicas e até físicas à vítima. "Muitas delas desenvolvem quadros de ansiedade, depressão e Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Algumas podem desenvolver ainda doenças psicossomáticas, como alergias e gastrite."

Por outro lado, os agressores não se sentem minimamente arrependidos pelo que fizeram. “Alguns são psicopatas diagnosticados, outros têm traços de psicopatia, que ficam proeminentes frente a determinadas circunstâncias, como situações que desencadeiam profundo sentimento de raiva. Vale ressaltar, no entanto, que apesar de serem homens com traços doentios, isso não quer dizer que não sejam criminosos. Eles precisam pagar pelo que fizeram", afirma a pscióloga.

Para Sônia, ter uma sólida rede de apoio é fundamental nesse momento. "A vítima precisa ser amparada. Tanto por um psicólogo – e em alguns casos, um psiquiatra, quando se faz necessário o uso de medicamentos –, quanto por pessoas próximas a ela. Oferecer um ombro amigo é muito importante nessa hora. E é sempre bom lembrar que frases do tipo ‘você deveria saber sobre os perigos da internet’ ou ‘eu te avisei que esse cara não prestava’ não ajudam em nada."

Helena não teve a sorte de contar com uma rede de apoio. "Eu não poderia contar para os meus pais na época, porque eles são bem 'fechados' e acho que ficariam desapontados comigo."

A garota, então, procurou seus professores da faculdade de Direito para saber o que podia ser feito, mas para sua decepção, eles confirmaram o que Pedro havia dito anteriormente: suas provas eram frágeis. "Fiquei muito desmotivada e acabei não abrindo o boletim de ocorrência. Me arrependo muito disso", diz.

Reunindo provas

De acordo com a coordenadora estadual das Delegacias de Defesa da Mulher de São Paulo, Jamila Ferrari, a primeira medida que as vítimas devem tomar é se dirigir a uma delegacia, seja ela especializada em crimes contra mulheres ou não, e abrir um boletim de ocorrência.

“Em um primeiro momento, a vítima será ouvida, e em seguida, ela pode ter seu celular ou outro dispositivo apreendido para que possa ser feita uma perícia específica. Durante o processo, será investigado o IP da máquina do agressor, se houve ou não manipulação da foto ou do vídeo, entre uma série de outras coisas", afirma.

Além disso, caso o material tenha sido postado em uma rede social, a polícia se encarregará de suspender a conta do agressor. Ao final da investigação, se ele for efetivamente condenado, poderá ser banido permanentemente da plataforma.

Segundo a delegada, caso a vítima não disponha das fotos ou vídeos em seu celular ou outro dispositivo, ela pode apontar o nome do agressor ou de alguma pessoa que tenha visto ou armazenado o material. “Essas pessoas, então, serão chamadas para depor, para que, de alguma forma, se tente chegar nessas provas.”

Para que haja a condenação, a polícia deve reunir evidências suficientes que comprovem que de fato, houve o crime. De acordo com a delegada, provas documentais são de suma importância para o desfecho do caso, mas, às vezes, o agressor pode ser condenado se a polícia se convencer de que o material foi deletado da rede.

Segundo Jamila, assim como todos os crimes sexuais, a subnotificação da pornografia de vingança é muito alta. "A vítima, muitas vezes, se sente culpada pelo crime e isso a impede de buscar ajuda. Ela acredita que, de alguma forma, colaborou para que isso pudesse acontecer, porque naquele momento da foto ou do vídeo, em tese, ela permitiu. Mas isso não significa que o agressor tinha o direito de expor esse material na internet. É importante ressaltar que a culpa nunca é e nunca será da vítima."

Helena está atualmente no último ano da faculdade e seu Trabalho de Conclusão de Curso tem como tema a pornografia de vingança. "Se na época eu tivesse tido condições psicológicas para ir atrás de mais provas e lutar por justiça, assim teria feito. Quero encorajar outras mulheres a agir dessa forma. Hoje em dia, mais do que nunca, estamos amparadas pela lei."

*Estagiária do R7 sob supervisão de Pablo Marques

**Os nomes reais foram trocados para preservar a vítima

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