Aprovação do licenciamento ambiental eleva risco de colapso ecológico, alerta especialista
Proposta apelidada de ‘PL da Devastação’ tem sido alvo de críticas por ambientalistas; texto seguirá para sanção presidencial
Brasília|Iasmim Albuquerque*, do R7, em Brasília

A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada de quinta-feira (17) o projeto de lei que estabelece novas regras de licenciamento ambiental. O texto, que teve 267 votos a favor contra 116, é conhecido como “PL da Devastação”, e tem sido alvo de críticas por desconsiderar a crise climática e enfraquecer a legislação ambiental.
O projeto, que já teve o aval do Senado Federal em maio, estabelece regras gerais para a concessão do Poder Público à instalação, ampliação e operação de projetos que usem recursos naturais ou que causem impacto ao meio ambiente.
Principais pontos do projeto
- Licença por Adesão e Compromisso (LAC): permite que empreendimentos sejam licenciados automaticamente, sem estudos dos impactos ambientais
- Enfraquecimento dos órgãos ambientais: reduz a atuação do Sisnama (Sistema Nacional do Meio Ambiente), do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e conselhos estaduais.
- LAE (Licença Ambiental Especial): permite ao governo federal acelerar o licenciamento de empreendimentos considerados estratégicos, mesmo que possam causar degradação ambiental
A proposta tramita no Congresso há mais de 20 anos e com a aprovação das duas Casas Legislativas, seguirá para a sanção presidencial, que poderá ser vetada ou sancionada.
Brasil pode viver colapso ecológico no futuro
O professor titular do Instituto Oceanográfico da USP (Universidade de São Paulo) e coordenador da Cátedra Unesco para Sustentabilidade do Oceano, Alexander Turra, a aprovação deste projeto pode desestruturar o próprio equilíbrio ecológico que sustenta a economia brasileira.
“A nova lei geral do licenciamento ambiental, diz respeito a uma perda homeopática, a um ecocídio homeopático que a gente vai verificar no país, comprometendo tanto o funcionamento dos ecossistemas como também tudo o que depende deles, ou seja, aspectos sociais e econômicos que vão ser prejudicados.”
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Turra ainda chama a atenção para o turismo brasileiro, que pode ser afetado por essa flexibilização do PL, visto que o risco de poluição em áreas sensíveis deve aumentar por falta de fiscalização.
“Dá para imaginar um setor turístico na região costeira conseguindo lidar com uma água poluída, ou aquicultura com água contaminada, ou mesmo a pesca, é incompatível. Então, o que nós temos que fazer é racionalizar as atividades humanas, porque para tudo tem regra. Nós temos aí uma questão que não se resume simplesmente aos ambientes naturais, ao oceano, à Amazônia, ao cerrado, ao Pantanal, aos pampas, a gente está falando de um sócio-ecossistema que vai ser afetado, direto ou indiretamente, por essa mudança”, declara o especialista.
Ministério do Meio Ambiente criticou proposta antes de ir à Câmara
Em maio, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma nota dizendo que o projeto de lei “representa um risco à segurança ambiental e social no país” e é “omisso em relação à crise climática”.
“A proposta terá impacto negativo para a gestão socioambiental, além de provocar, possivelmente, altos índices de judicialização, o que tornará o processo de licenciamento ambiental mais moroso e oneroso para a sociedade e para o Estado brasileiro”, informou a nota da pasta.
Nesta quinta, após a aprovação do PL, o ministério voltou a falar que vê riscos ao país e disse que avalia ”caminhos institucionais" adequados para enfrentar os prejuízos decorrentes do projeto. “A equipe técnica do MMA já trabalha na análise dos encaminhamentos cabíveis.”
Tragédias em Brumadinho e Mariana poderão se repetir
Para Turra, as tragédias em Brumadinho e Mariana, em Minas Gerais, mostraram o preço de falhas no licenciamento ambiental, e se o projeto for aprovado, desastres como esses ocorrerão futuramente.
“O que vimos em Brumadinho e Mariana foi, na verdade, o início de uma série de outros grandes desastres ou crimes que poderão se repetir e que irão se repetir ao longo do país. Mas não serão só desastres de grande monta como esses. Teremos uma conjuntura em que nós teremos uma série de pequenos impactos, e é por isso que eu chamo de um ecocídio homeopático, que vão aparentemente e isoladamente não causar grandes alterações, mas que em conjunto vão fazer com que nós tenhamos uma perda de qualidade ambiental e uma perda de tudo o que depende disso, inclusive as próprias atividades econômicas que realizamos”, disse o professor.
PL é inconstitucional e não ajuda nas metas das conferências climáticas, diz especialista
Para o especialista, o texto vai contra o artigo 225 da Constituição, que estabelece o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Além disso, ele ressalta que, caso seja sancionado pelo presidente, o Brasil perderá a qualidade de vida e não conseguirá cumprir as metas ambientais e climáticas.
“Quando essa flexibilização for colocada em prática, vamos ter uma perda uma grande da capacidade de cumpri as metas ambientais e climáticas nas Conferências do clima, por exemplo, ou da biodiversidade, gerando grandes prejuízos e fazendo a gente perder a nossa qualidade de vida”, afirma Turra.
COP30 será em novembro
Em novembro, o Brasil sediará a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) entre 10 e 21 de novembro de 2025, em Belém (PA).
A Conferência reunirá líderes globais, cientistas, ambientalistas e representantes da sociedade civil e do setor privado para discutir ações de combate à crise climática.
O foco principal será a redução de emissões de gases de efeito estufa, a adaptação às mudanças climáticas e o financiamento climático para países em desenvolvimento.
*Sob supervisão de Leonardo Meireles
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