Ministro de Lula diz que governo não levará proposta alternativa do IOF ao Supremo
Audiência de conciliação entre Executivo e Legislativo ocorre nesta terça; Congresso derrubou decreto de Lula
Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília

O ministro da Casa Civil, Rui Costa, declarou nesta segunda-feira (14) que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva não vai levar proposta alternativa ao aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) ao STF (Supremo Tribunal Federal). A audiência de conciliação na Suprema Corte entre governo e Legislativo ocorre nesta terça (15), por determinação do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.
O Executivo levou o embate ao Judiciário após o Congresso Nacional derrubar o decreto de Lula que promoveu mudanças no imposto — cobrado de pessoas físicas e jurídicas em operações financeiras como câmbio, crédito e seguros.
“O governo já tem a proposta, que foi o que fez o decreto. A posição oficial do governo é o decreto, e o governo pediu que STF se manifeste. Então, não tem proposta alternativa, nossa posição é aquela, de defesa do decreto. O governo não fará negociação sobre esse tema. O governo defenderá manter a defesa judiciária do seu decreto”, declarou Costa a jornalistas, após evento no Palácio do Planalto.

O tema é alvo de embate entre Congresso e governo. A disputa ganha novo capítulo com o início das discussões na Justiça — a audiência desta terça está marcada para as 15h, com a presença da AGU (Advocacia-Geral da União).
O encontro será fechado à imprensa e somente representantes autorizados poderão acompanhar o evento no local.
A principal justificativa do governo no decreto é que a mudança ajudaria a aumentar a arrecadação e, por consequência, contribuir para o equilíbrio das contas públicas.
O Congresso argumenta que a alteração foi feita sem a devida aprovação legislativa e que ela geraria impacto significativo em setores produtivos e nos consumidores.
Com a judicialização do tema pelo Executivo, Moraes determinou a derrubada de todos os efeitos causados pela medida do governo. O ministro também decidiu que os dois Poderes devem debater o assunto.
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Entenda a discussão em 5 pontos:
1. O que é o IOF?
O IOF é um tributo federal cobrado de pessoas físicas e jurídicas sobre diversas operações financeiras realizadas no Brasil.
Ele incide sobre:
- Empréstimos e financiamentos;
- Operações de câmbio;
- Contratações de seguros;
- Transações com títulos e valores mobiliários.
Originalmente, o IOF foi criado para funcionar como um instrumento de regulação da economia, servindo como “termômetro” da demanda e oferta de crédito no país.
No entanto, ele também passou a ser utilizado como importante fonte de arrecadação federal.
Algumas operações são isentas do imposto, como adiantamentos salariais e o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).
2. O que propôs o governo e qual foi a justificativa?
Em maio deste ano, o governo federal anunciou um aumento no IOF aplicado a:
- Empresas;
- Previdência privada;
- Operações de câmbio.
As mudanças não afetariam:
- Empréstimos pessoais de pessoas físicas;
- Crédito estudantil;
- Financiamentos habitacionais;
- Empréstimos via Finame (para aquisição de máquinas e equipamentos).
A principal justificativa era conter despesas e manter as finanças públicas nos limites fixados pela política fiscal.
Exemplos e o que não muda
- Compra de US$ 100 com cartão de crédito internacional: IOF de US$ 3,50 (3,5%).
- Remessa de R$ 10 mil para o exterior: IOF de R$ 350, além de taxas bancárias.
Operações que continuariam isentas
- Compras em sites estrangeiros pagos em reais (sujeitas a outros tributos, como ICMS e imposto de importação).
- Passagens aéreas internacionais.
- Gastos com cartões de turistas estrangeiros no Brasil.
3. Por que o Congresso Nacional barrou a medida?
Após a publicação da decisão do governo, o Congresso Nacional se articulou e derrubou três decretos presidenciais, incluindo o que trazia as mudanças no IOF.
O texto, assinado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, em 27 de junho, restabelece a redação original do Decreto nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007, que normatizava o tributo antes das alterações.
Nos bastidores, congressistas demonstravam insatisfação com ações do Ministério da Fazenda para equilibrar as contas em 2025. A percepção era de esforço concentrado na elevação de tributos para reforçar a arrecadação.
Outro foco de desgaste envolve o ritmo de liberação de emendas parlamentares, considerado lento por parte de líderes.
O projeto que anulou a alta do IOF entrou na pauta da Câmara de última hora, por iniciativa do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), um dia antes da votação.
4. O que acontece agora no STF?
Diante do impasse, o governo levou a questão ao Supremo Tribunal Federal, movimento previsto na legislação brasileira. Porém, outros pedidos, feitos por partidos políticos, também chegaram à Corte.
Um deles, do PSOL, iria para a relatoria de Gilmar Mendes, que sugeriu que o processo fosse repassado para Alexandre de Moraes, que já tratava de outras ações da mesma natureza.
A solicitação foi aceita e agora a matéria está sob a responsabilidade de Moraes.
Em 4 de julho, Moraes suspendeu todos os efeitos dos decretos presidenciais que tratam do aumento do IOF e determinou uma audiência de conciliação entre o Executivo e o Congresso Nacional.
O objetivo é conter a escalada da crise institucional provocada pelo embate entre os dois Poderes em torno do tema.
Ao analisar o caso, Moraes afirmou haver indícios de que os decretos podem ter se desviado de sua finalidade constitucional. O IOF, por definição, é um imposto de natureza extrafiscal — usado para regular a economia, e não para fins arrecadatórios diretos.
Se for comprovado que o aumento teve como único propósito elevar a arrecadação, poderá haver desvio de finalidade e, portanto, inconstitucionalidade.
5. O que dizem os especialistas?
Segundo o advogado Alexandre Mazza, especialista em direito tributário, a Constituição Federal autoriza o aumento do IOF por decreto.
Porém, em situações bastante excepcionais que exijam mudanças rápidas que não possam esperar o tempo necessário para o Congresso Nacional decidir a matéria.
“Existe aí um claro limite, ou seja, não se pode aumentar o IOF por decreto para simplesmente equilibrar as contas públicas ou compensar alguma perda arrecadatória. Isso é bem claro no Texto Constitucional”, explica.
Além disso, o impacto prático das decisões do STF é a imediata suspensão das mudanças, o que leva as operações financeiras que tiveram aumento de tributação a voltar aos patamares anteriores.
Mazza também acredita que a judicialização do IOF pode abrir precedente para contestar outros aumentos de tributos via decreto.
“Esse precedente reforça a ideia de que, em última análise, sempre cabe ao Supremo Tribunal Federal julgar a constitucionalidade da parte mais relevante dos temas tributários. O STF é o juiz final da tributação brasileira”, ressalta.
Já Rodrigo Simões, economista e professor da Faculdade do Comércio, afirma que essa situação é “uma queda de braço” entre os Poderes.
“O governo quer tentar equilibrar um pouco mais, trazer um pouco mais de justiça tributária”, comenta o professor.
A ideia, segundo o especialista, seria taxar mais quem tem mais renda ou mais aplicação financeira, enquanto quem tem menos seria isento.
Simões comenta que o aumento do imposto pegaria em torno de 7% da população — cidadãos com comércios voltados a enviar dinheiro para fora ou pessoas com investimentos em fundos com aporte acima de R$ 600 mil por ano.
Sobre a disputa que chegou ao STF, ele prevê que, ao fim, o governo consiga pelo menos parte do reajuste que previa.
“Eu acredito que vai ter um pouco de reajuste, até mesmo porque o governo precisa fechar a conta, ele precisa entregar essa meta de superávit primário para esse ano de 2025, porque a gente já está olhando ali um déficit, um rombo nas contas públicas de 70, 80 bilhões de reais, e o governo está correndo atrás disso”, afirma.
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