Políticos de vários partidos querem Guedes investigado por offshore
Especialistas ouvidos pelo R7 dizem que a atuação de Guedes na Economia pode caracterizar conflito de interesses
Brasília|Isabella Macedo, do R7, em Brasília
Um dia após a revelação de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, mantém uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, paraíso fiscal no Caribe, políticos de várias tendências e partidos se manifestaram pedindo que o caso seja investigado.
Reportagem feita por um consórcio internacional de imprensa revelou neste domingo (3) que Guedes tem investimentos de US$ 9,5 milhões na offshore. A desvalorização do real durante o comando de Guedes no Ministério da Economia fez com que seu investimento, que equivalia a R$ 35 milhões em agosto de 2015, hoje seja estimado em mais de R$ 51 milhões. Ele teria lucrado R$ 14 mil por dia desde que passou a ocupar o cargo de ministro, conforme revelou o R7.
O líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), e outros líderes de partidos que se opõem ao governo do presidente Jair Bolsonaro protocolaram uma representação no Ministério Público pedindo que Guedes seja investigado por improbidade administrativa.
O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) e líderes na Câmara também anunciaram que vão pedir a convocação do ministro para dar esclarecimentos no plenário sobre as denúncias. Em suas redes sociais, Kataguiri classificou como “gravíssima” a revelação da manutenção de offshore por Guedes enquanto exerce o cargo de ministro da Economia.
O deputado afirmou que também apresentará pedido ao Ministério Público para que o ministro seja alvo de investigação. “Além da convocação, apresentarei representação ao MPF para que o ministro seja investigado. Em havendo comprovação, é caso de impeachment e cadeia”, escreveu Kataguiri em sua conta.
Do outro lado do Congresso, o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal (STF). No documento, Randolfe pede que o Supremo requeira à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma investigação preliminar e instauração de inquérito.
Ex-apoiador do governo Bolsonaro, o deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) também criticou Guedes, a quem chamou de “especulador de mercado”. “E, com a fome e a miséria no Brasil, ficou mais rico ainda. Deveria ser exonerado do governo. Mas, como é o Bolsonaro, nada vai acontecer”, criticou o deputado.
O deputado federal e advogado Fábio Trad (PSD-MS) afirmou, também por meio de suas redes, que o caso é “insustentável eticamente”.
“Se mantém empresa, não pode ser ministro de Estado. Se mantém empresa fora do país, aí é que não pode mesmo. Se mantém empresa fora do país em regime de tributação diferenciada (offshore), a situação fica insustentável eticamente, afinal se trata do ministro da Economia”, apontou.
O deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ), líder da Minoria na Câmara, ironizou a situação do ministro. Com a nova alta do dólar nesta segunda, o deputado afirmou que Guedes “deve estar festejando”.
Pandora Papers
A investigação que revelou uma série de offshores ligadas a políticos, empresários e celebridades de vários países foi batizada de “Pandora Papers” e conduzida por 615 jornalistas de 149 veículos em 117 países. Entre as empresas envolvidas na apuração estão o jornal The Washington Post, a rede britânica BBC, a Radio France, o jornal alemão Die Zeit e a TV japonesa NHK.
Na lista de brasileiros donos de offshores aparece também o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Guedes e Campos Neto disseram que os empreendimentos estão declarados na Receita Federal e negam irregularidades.
A "Pandora Papers" aponta que Campos Neto respeitou as normas vigentes ao não fazer investimentos depois de assumir o cargo no Banco Central. Guedes mantém a empresa aberta e não respondeu se fez alguma movimentação ou a natureza de uma possível operação do tipo.
A lei permite que brasileiros mantenham empresas offshore, contanto que elas sejam declaradas junto à Receita Federal e ao Banco Central. Também é exigido que os recursos tenham origem lícita. Quem tem cargo público fica sujeito a uma série de regras específicas, justamente para evitar autofavorecimento.
Especialistas ouvidos pelo R7 dizem que a atuação de Paulo Guedes no comando do Ministério da Economia pode caracterizar conflito de interesses – quando Guedes defendeu em julho retirar do PL do Imposto de Renda a regra que tributaria recursos em paraísos fiscais. A proposta encaminhada por ele ao Congresso daria isenção de impostos sobre os rendimentos de empresas no exterior o beneficiaria diretamente. Ele também teria atuado para ampliar o limite de depósitos no exterior que não precisam ser declarados.
Nesta segunda, ao participar de um evento do Tribunal de Contas da União sobre o Orçamento, Guedes não se manifestou sobre o assunto. Em sua agenda oficial para esta segunda, o ministro tinha ainda duas reuniões previstas, com o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e com o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Caio Paes de Andrade.