Tarifaço de Trump joga Brasil em encruzilhada diplomática e econômica, dizem especialistas
Efeitos são imediatos no agro e existem riscos eminentes à estabilidade cambial. Governo brasileiro promete negociar
Brasília|Luiza Marinho*, do R7, em Brasília

A novela da tensão comercial entre Brasil e Estados Unidos ganha novos capítulos a cada dia. Após o anúncio da tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos EUA e a abertura de uma investigação sobre supostas práticas comerciais desleais por parte do Brasil, especialistas ouvidos pelo R7 afirmam que o governo federal precisa negociar com firmeza, porém sem abrir mão da soberania.
Mesmo antes da tarifa entrar oficialmente em vigor, os efeitos já são sentidos. Segundo o advogado Celso Figueiredo, especialista em direito internacional pela USP (Universidade de São Paulo), o clima de incerteza tem paralisado embarques e negócios entre os dois países.
“Só o fato de existirem ameaças já gera uma insegurança jurídica demasiada para os setores que exportam e importam. Há dúvidas se o produto enviado agora será sobretaxado, o que já levou à paralisação de vários negócios”, alerta.
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Além da insegurança, o impacto prático também será severo para setores estratégicos. Figueiredo destaca que o agronegócio será o mais atingido, com prejuízos para exportações de carne, café, suco de laranja, açúcar e celulose.
Setores como mineração, siderurgia, metalurgia e até a aviação, com os aviões da Embraer, também devem sofrer perdas relevantes.
Alternativas viáveis
O gesto de Trump tem forte peso político. O presidente norte-americano vem fazendo críticas recorrentes ao Brics e tenta enfraquecer o bloco liderado por economias emergentes. O Brasil, que tem papel ativo na articulação com China, Rússia, Índia e África do Sul, estaria na linha de frente dos ataques.
“Parece haver um esforço para reforçar a imagem hegemônica dos EUA, penalizando iniciativas que não estejam alinhadas com Washington. Isso pode acelerar negociações de novos acordos comerciais com outros países, numa tentativa de escapar da insegurança jurídica de fazer negócios com os EUA de Trump”, explica Celso Figueiredo.
Buscar outros parceiros comerciais é uma saída, mas que exige tempo e articulação. Para Figueiredo, o Brasil tem interesse em diversificar relações, mas encontra obstáculos por fazer parte do Mercosul, que exige negociação conjunta em acordos internacionais.
Para ele, o Brasil precisa manter a firmeza diplomática e não ceder politicamente às pressões norte-americanas, mas sim encontrar brechas que permitam “dar uma saída honrosa” a Trump — sem comprometer a soberania nacional.
“O ponto chave é identificar um tema, por irrelevante que seja, que Trump possa apresentar como vitória interna. É uma questão de ‘timing’. Mas o Brasil não deve abrir mão da autonomia para manter relações comerciais”, afirma Figueiredo.
Dólar mais caro, inflação e risco fiscal
Do ponto de vista econômico, os efeitos das tarifas também preocupam. Para o advogado tributarista Leonardo Roesler, o tarifaço pode ter impacto estrutural na balança comercial, pressionar o câmbio, aumentar a inflação e enfraquecer o crescimento do país.
“A tarifa generalizada de 50% deslocaria pedidos para outros fornecedores, reduzindo a participação do Brasil no mercado de tecnologia embarcada, como aeronaves e equipamentos de energia”, aponta Roesler. “Isso enfraqueceria cadeias produtivas e elevaria o custo do capital.”
Ele alerta que uma queda nas exportações para os EUA pressionaria o real, exigindo um prêmio de risco maior na rolagem da dívida externa, além de aumentar a volatilidade no mercado cambial e os custos de importação.
“A tarifa reduz a margem das exportadoras, golpeia o investimento em setores estratégicos e pode comprimir o PIB em até 0,3 ponto percentual. Se a tensão se prolongar, o país pode até ter o rating rebaixado e sofrer fuga de capitais”, completa.
*Sob supervisão de Leonardo Meireles
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