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Nobel de Economia define taxa de juros brasileira como 'chocante'

Joseph Stiglitz, premiado em 2001, diz que a Selic equivale a uma 'pena de morte' e que o país sobrevive graças aos bancos públicos  

Economia|Do R7, com agências

Joseph Stiglitz é professor da Universidade de Columbia (EUA)
Joseph Stiglitz é professor da Universidade de Columbia (EUA)

Joseph Stiglitz, vencedor do prêmio Nobel de Economia em 2001 e professor da Universidade Columbia (EUA), definiu a taxa básica de juros brasileira como "chocante" e equivalente a uma "pena de morte". Para ele, o país tem sobrevivido graças à atuação dos bancos públicos. A avaliação foi feita na manhã desta segunda-feira (20), no Rio de Janeiro, durante uma apresentação no seminário "Estratégias de desenvolvimento sustentável para o século 21".

O evento foi promovido pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em parceria com o Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) e com a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

Sem mencionar diretamente a autoridade monetária, Stiglitz fez duras críticas ao BCB (Banco Central Brasileiro) e sua política monetária nos últimos anos, que usa os juros para conter a inflação, sem observar os efeitos nocivos sobre o investimento. "Um Banco Central independente e com mandato só para inflação não é o melhor arranjo para o bem-estar do país como um todo", falou.

"A taxa de juros de vocês [brasileiros] é de fato chocante. Uma taxa de 13,7%, ou 8% real, é o tipo de juro que vai matar qualquer economia. É impressionante que o Brasil tenha sobrevivido a isso, que seria uma pena de morte. E parte da razão disso é que vocês têm bancos estatais, como o BNDES, que têm feito muito com essas taxas de juros, oferecendo fundos a empresas produtivas para investimentos de longo prazo, com juros menores", avaliou.


O economista afirmou que, se a política monetária fosse mais razoável, o país poderia ter um crescimento bem maior que o registrado nas últimas décadas. Isso porque os juros altos da economia desencorajaram investimentos, inclusive os ora necessários para promover uma transição verde na economia, capaz de levar o Brasil da posição de exportador de commodities para uma economia industrial relevante no cenário internacional.

"A necessidade de se adaptar à transição verde e reduzir a desigualdade torna ainda mais urgente buscar modelos econômicos alternativos. As questões aqui são mais urgentes do que em outros países do mundo. O Brasil sempre foi descrito como o país do futuro, mas o futuro continua sempre deixado para o futuro."


Stiglitz disse ter verificado uma piora do cenário nos últimos quatro anos, quando o país teve um "presidente não indutor de crescimento econômico" — em referência ao governo de Jair Bolsonaro (PL). O professor explicou que, por isso, as taxas de crescimento se mantiveram deprimidas, enquanto o desemprego e a informalidade continuaram em níveis altos, de 13% e 40% respectivamente, com queda na renda das famílias.

Avaliação da Fiesp e Alckmin

O presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Josué Gomes da Silva, também criticou as taxas de juros do Brasil, ao chamá-las de "pornográficas". Em seu discurso no evento, ele disse que os atuais valores são inconcebíveis e precisam ser reduzidos.


Josué Gomes da Silva, presidente da Fiesp
Josué Gomes da Silva, presidente da Fiesp

“É inconcebível a atual taxa de juros no Brasil. Muitos querem associá-la a um problema fiscal. A tese é que há um abismo fiscal, num país que tem 73% do PIB de dívida bruta. Tirando as reservas [cambiais], são mais ou menos 54% de dívida. Tirando o caixa do Tesouro Nacional, são menos de 45% do PIB de dívida líquida, num país com a riqueza do Brasil. Não é uma boa explicação para as 'pornográficas' taxas que praticamos.”

Segundo Gomes da Silva, as altas taxas de juros prejudicam os investimentos na indústria brasileira.

No mesmo evento, o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, também criticou o valor da taxa básica de juros, a Selic, que está em 13,75% desde agosto do ano passado.

“Não há nada que justifique ter 8% de taxa de juros real, acima da inflação, quando não há demanda explodindo e, de outro lado, no mundo inteiro, há praticamente juros negativos. Nós acreditamos no bom senso e que a gente vá, com a nova ancoragem fiscal, superar essa dificuldade”, declarou.

O Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central, reúne-se a partir desta terça-feira (21), para definir a nova taxa Selic.

A inflação no mundo

Ainda em sua palestra, Joseph Stiglitz falou sobre o cenário econômico mundial e disse que a discussão sobre juros, dominante no debate público brasileiro, também acontece nos EUA, a despeito de os juros serem bem mais baixos.

Para o economista, é um erro perseguir meta de inflação com alta de juros. Além disso, ele explicou que a inflação americana e a mundial não advêm de pressão de demanda, mas estão diretamente ligadas à pandemia e, agora, à guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

As taxas de juros crescentes em diversos países do mundo pioram o problema, porque impedem investimentos, por exemplo, em habitação.

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"Uma fonte de inflação importante é a indústria de óleo e gás e de alimentos. Outra fonte tem sido a habitação. Mas as taxas de juros recentes não resolvem nenhum desses problemas. Como isso [as taxas mais altas] vai trazer mais petróleo e mais gás? A resposta é que, claramente, não é possível", afirmou o professor.

Segundo Stiglitz, o efeito mais direto dessa recente escalada de juros nos EUA e no mundo é a criação de barreiras ao investimento, inclusive em áreas críticas, como habitação, além de uma "redistribuição de dinheiro dos pobres aos ricos". "As altas taxas de juros exacerbam problemas de desigualdade, como o do Brasil."

Em paralelo, disse ele, essa política monetária aumenta o problema fiscal, devido ao aumento dos juros sobre a dívida pública, situação que se agrava ainda mais em países com maior endividamento.

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