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‘Esperança’, diz médico sobre nova técnica contra câncer de pâncreas, doença de Edu Guedes

Procedimento minimamente invasivo já destruiu tumores em 11 pacientes em hospital de São Paulo e pode representar um novo olhar para o tratamento

Entrevista|Bianca Fávero*, do R7

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Edu Guedes causou comoção ao revelar diagnóstico de câncer de pâncreas; novo tratamento pode substituir cirurgias tradicionais Reprodução/Instagram/@eduguedesoficial

Silencioso, agressivo e de difícil diagnóstico, o câncer de pâncreas voltou aos holofotes como um alerta após o apresentador Edu Guedes revelar que passou por uma cirurgia para retirada do tumor. A doença, que costuma evoluir sem sintomas nas fases iniciais, é uma das mais letais da oncologia: representa apenas 1,6% dos casos no Brasil, mas é responsável por cerca de 5% das mortes por câncer, segundo o (Inca) Instituto Nacional de Câncer.

Casos como o de Edu Guedes ajudam a jogar luz sobre um problema que, embora raro, é devastador. Patrick Swayze, Steve Jobs e Aretha Franklin também enfrentaram o mesmo diagnóstico — em comum, a descoberta tardia e a rápida evolução da doença.


RESUMO DA NOTÍCIA

  • O câncer de pâncreas é uma doença silenciosa e letal, responsável por cerca de 5% das mortes por câncer no Brasil.
  • Uma nova técnica de radiofrequência minimamente invasiva já tratou 11 pacientes em um hospital de SP, mostrando resultados promissores.
  • Esse procedimento é menos invasivo, com menor custo e risco de complicações em comparação à cirurgia convencional.
  • Especialistas destacam a importância da esperança no tratamento e a necessidade de mais pesquisas sobre a doença.

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Entre os avanços mais recentes no tratamento, a nova técnica minimamente invasiva de radiofrequência guiada por ecoendoscopia apresentou resultados promissores. A estratégia, que começou a ser realizada no mundo há menos de seis anos, já destruiu tumores em 11 pacientes tratados pelo professor José Celso Ardengh, gastroenterologista e coordenador do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Moriah, em São Paulo, além de médico da USP de Ribeirão Preto.

“O procedimento evita a cirurgia para casos em que o tumor é pequeno e localizado, como os tumores neuroendócrinos funcionantes ou não-funcionantes. E, além de ser menos invasivo, tem menor custo e menor risco de complicações, como a chance de o paciente se tornar diabético após a retirada parcial do pâncreas, como ocorre em cirurgias tradicionais”, explica Ardengh em entrevista ao R7.


Segundo o médico, o tratamento diminui o tempo de internação, reduz os efeitos adversos e não impede outras abordagens futuras, como a cirurgia convencional. O câncer de pâncreas teve 12.654 óbitos registrados no Brasil em 2022 e a estimativa do Inca é de 5.690 novos casos por ano. Embora os tumores neuroendócrinos correspondam a apenas 3% das neoplasias pancreáticas, o avanço de técnicas como essa representa um novo horizonte para o tratamento.

Confira a entrevista com o Dr. José Celso Ardengh


R7 - O câncer de pâncreas representa uma pequena parcela dos diagnósticos oncológicos no Brasil, mas é responsável por um número significativo de mortes. Como o tumor atua no corpo e por que ele é considerado tão letal?

José Celso Ardengh - O câncer de pâncreas acomete a glândula pancreática, e a grande maioria dos casos são tumores extremamente malignos, que é o adenocarcinoma. Além dessa característica, ele tem um prognóstico muito ruim. O fato de você ter praticamente 1%, que são os dados que você mostrou, evidencia que o diagnóstico é difícil e, além disso, ele mata muito mais. Já existem trabalhos epidemiológicos mostrando que o câncer de pâncreas está aumentando com o passar dos anos. A gente ainda não sabe o motivo. Por ser um câncer de difícil diagnóstico, também é um câncer de difícil tratamento. A única possibilidade de cura é o procedimento operatório, mas só quando o tumor é muito pequeno — o que é raro. A maioria dos pacientes é diagnosticada em estágio avançado.


R7 - Por que o diagnóstico costuma acontecer em estágios avançados?

Ardengh - O pâncreas é uma glândula que se encontra na região mais posterior, como se estivesse no fundo de um baú. Está colado à coluna vertebral. Do lado direito, temos a cabeça do pâncreas; depois, o corpo e a cauda. As lesões no corpo e na cauda não dão repercussão. Só quando crescem e invadem estruturas adjacentes é que o paciente começa a sentir dor abdominal — mas isso só acontece em estágio muito avançado. Se a lesão estiver na cabeça do pâncreas, é mais fácil diagnosticar, porque ela pode causar obstrução do colédoco ou do duodeno, levando à icterícia (amarelamento da pele e dos olhos), especialmente em pessoas acima dos 50 anos.

José Celso Ardengh, gastroenterologista e coordenador do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Moriah, em SP, fala sobre o tratamento Divulgação - 21.07.2025

R7 - Quais são os principais sintomas que podem indicar um problema no pâncreas? Existem fatores de risco associados a esse tipo de tumor?

Ardengh - Se o tumor está no corpo ou na cauda, o principal sintoma é dor abdominal, empachamento. Se está na cabeça, pode causar obstrução, empachamento da região do duodeno ou icterícia, que é o sintoma mais frequentemente observado no tumor de pâncreas. Sobre fatores de risco, pacientes com diabetes de início recente, especialmente após os 50 anos, devem investigar. Outro ponto fundamental são dores nas costas persistentes, sem diagnóstico ortopédico. Nesses casos, o ideal é procurar um gastroenterologista, porque você pode estar frente a um câncer de pâncreas. Se a pessoa tem mais de dois parentes de primeiro grau com a doença, também é recomendado fazer o acompanhamento com exames de imagem. Mas não existe forma de rastreio efetiva. Isso dificulta muito o diagnóstico precoce e quanto menor você detectar esse câncer, maior chance de cura você terá.

R7 - Há exames preventivos recomendados para grupos de risco?

Ardengh - A ressonância magnética é um exame que ajuda a fazer a avaliação da glândula pancreática. A tomografia computadorizada também ajuda. E temos um exame bem especializado, com alto desempenho, que é a ecoendoscopia, feita pela boca. Você coloca o transdutor no duodeno, ao lado da cabeça do pâncreas, e consegue examinar toda a glândula. Se houver um nódulo, é possível fazer biópsia na hora. Nenhum desses exames, no entanto, é usado como screening, porque não temos um grupo de risco definido para aplicar isso na população geral. Isso nos traz uma grande angústia, do ponto de vista científico, porque a gente, infelizmente, não consegue fazer esse tipo de diagnóstico.

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R7 - Quais são as opções de tratamento mais comuns para o câncer de pâncreas?

Ardengh - No caso do adenocarcinoma, que é o tumor mais grave, a única chance de cura é a cirurgia — mas só se o tumor for pequeno e localizado. Na maioria das vezes, isso não acontece. Como o tumor cresce dentro da glândula e não dá sintomas, é raro pegá-lo cedo. Se o paciente não tem condições clínicas para cirurgia, pode ser submetido à quimioterapia que, nos últimos anos, tem melhorado a sobrevida dos pacientes. No caso dos tumores neuroendócrinos, que geralmente têm comportamento mais benigno, é possível fazer cirurgia também, e há opções como o procedimento de radiofrequência.

R7 - Como funciona o tratamento por radiofrequência guiada por ecoendoscopia e para quais casos é indicado? Esse tipo de procedimento pode ser aplicado em casos avançados ou é mais eficaz em fases iniciais?

Ardengh - A radiofrequência é uma técnica em que, através do ecoendoscópio — que tem um transdutor de ultrassom — você passa uma agulha pelo canal de biópsia e faz uma punção no tumor. É indicada, principalmente, para tumores neuroendócrinos menores que 2,5 cm. Hoje temos duas estratégias terapêuticas: o seguimento ativo ou a radiofrequência. Muitos pacientes não querem cirurgia e também não querem manter o tumor, então indicamos a radiofrequência. Ela é especialmente eficaz em casos de insulinomas, tumores que produzem insulina em excesso e causam crises de hipoglicemia. Com a radiofrequência, destruímos o tumor e, assim, eliminamos os sintomas. O objetivo é esse. No caso de tumores mais avançados, como adenocarcinoma, a técnica é uma abordagem em estudo, mas ainda considerada off label. A radiofrequência emite calor na ponta da agulha, atingindo de 60°C a 100°C, causando necrose coagulativa, ou seja, destruição total do tumor.

R7 - Quais as vantagens dessa técnica em relação à cirurgia tradicional?

Ardengh - A radiofrequência é minimamente invasiva, mas ainda é um procedimento invasivo. A diferença é que, comparada à cirurgia, tem menor taxa de complicações e mortalidade. Por exemplo, se eu indico radiofrequência para um paciente com tumor neuroendócrino e não consigo destruir o tumor, posso recorrer à cirurgia depois — sem atrapalhar o procedimento operatório. Mas não é isenta de riscos. Pode haver estenose do ducto pancreático, pancreatite aguda ou hematomas, especialmente em tumores muito próximos do ducto. Mesmo assim, a frequência desses efeitos adversos é menor do que os de uma cirurgia tradicional.

R7 - A medicina vem evoluindo, mas ainda há muito a ser feito na detecção precoce de doenças. O que falta para avançarmos nesse ponto?

Ardengh - Depois que o Steve Jobs morreu com um tumor neuroendócrino, ele deixou milhões para a pesquisa. Eu acho que é o que a gente precisa, principalmente no Brasil, para tentar melhorar a sobrevivência desses pacientes. Nós não temos uma pesquisa adequada em relação a esse tumor que mata muitos brasileiros, imagina quantos por aí não são diagnosticados. Eu me lembro de um trabalho publicado por uma aluna do interior do Nordeste que apontou um aumento de mais de 20% das internações no SUS por câncer de pâncreas nos últimos cinco anos. Isso tem deixado a gente realmente muito preocupado com a doença que é de difícil diagnóstico, de difícil tratamento e, além de tudo, ela é muito cara para ser tratada.

R7 - Que mensagem o doutor deixa para pessoas que têm medo de buscar diagnóstico por conta do estigma de que o câncer de pâncreas é sempre uma sentença?

Ardengh - O que eu sempre digo para os meus pacientes é o seguinte: acredite na cura. Você tem sempre que acreditar na cura. Apesar de ser um câncer agressivo, você tem que acreditar no seu médico — seja no procedimento operatório, na quimioterapia ou em outras abordagens. É preciso ter esperança de que vai conseguir superar essa batalha. E eu também tenho muita esperança de que o governo e todos os envolvidos na melhoria da saúde da população nos ajudem a tratar essa doença de forma mais racional, mais inteligente — e que nos ajudem na pesquisa.

*Sob supervisão de Júlia Ramos, editora do R7

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