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Devagar e sempre: por que acumular exercícios aeróbicos fáceis é melhor do que atividades de alta intensidade

A verdadeira eficiência da Zona 2 é que ele permite que você se recupere rapidamente e volte a fazê-la no dia seguinte

Internacional|Alex Hutchinson, do The New York Times

Entusiastas dizem que atividades moderadas podem ser a chave para a longevidade Petra Péterffy/The New York Times

Quando publicou seu livro muito bem-sucedido sobre longevidade, Outlive: A Arte e a Ciência de Viver Mais e Melhor, em 2023, o podcaster e médico Peter Attia apresentou para um público muito mais amplo um conceito de treino específico.

Ele afirma que o treinamento Zona 2, que se refere a períodos longos e relativamente fáceis de exercícios, é crucial para a saúde metabólica – ideia que vai contra o conceito, vigente há mais de uma década, de que não há nada melhor que o treinamento intervalado de alta intensidade.

Ir devagar e sempre não é um conceito novo, mas Attia e outros entusiastas do Zona 2 juntam a essa ideia o caráter de biohacking de alta tecnologia (combinação de biologia e inovação para otimizar o corpo e a mente), ampliando o debate. Não se trata apenas de fazer, digamos, um passeio de bicicleta relaxado; trata-se de manter um nível muito específico de intensidade que não seja nem muito fácil nem muito difícil.

Os entusiastas do Zona 2 acreditam que se exercitar nesse nível de esforço durante pelo menos algumas horas por semana pode ajudar a evitar condições crônicas de saúde, como diabetes tipo 2 e doenças cardíacas. Mas alguns cientistas que estudam a saúde metabólica não estão convencidos de que esse treinamento muito específico seja, de fato, eficiente.


O que é o treinamento Zona 2?

O burburinho em torno do Zona 2 é baseado no trabalho de Iñigo San Millan, professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Colorado. Ex-ciclista profissional, há muito tempo San Millan ajuda a treinar ciclistas – incluindo Tadej Pogacar, tricampeão do Tour de France –, além de desenvolver pesquisa acadêmica.

Em seu trabalho com ciclistas, classificou os exercícios em seis zonas de treinamento diferentes, com base, em parte, no tipo de combustível que os músculos estão queimando, para explicar como o corpo responde a diferentes intensidades de treino. Na zona mais fácil, que para uma pessoa comum pode ser uma caminhada rápida, você está queimando principalmente gordura.


Conforme aumenta o esforço, você queima mais gordura – mas só até determinado ponto. Acima de certo nível de esforço, o corpo começa a depender mais de carboidratos e diminui a queima de gordura. Os níveis sanguíneos de lactato – substância química produzida pelo corpo humano durante a atividade física intensa – também começam a aumentar, sinal de que seus músculos estão trabalhando mais. “De uma perspectiva metabólica, algo estranho acontece quando você cruza esse limite”, disse San Millan.

Ao longo dos anos, ele observou que os melhores ciclistas tendem a passar grande parte do seu tempo de treinamento logo abaixo desse ponto. Esse não é o único tipo de treinamento que fazem, ele enfatizou – um ponto que às vezes se perde no exagero que a mídia social dedica ao Zona 2. Mas afirmou que, quanto mais tempo passam nessa zona, melhores ficam.


Por que o Zona 2 pode ser bom para você?

É pouco debatido se acumular muitos exercícios aeróbicos relativamente fáceis é bom para a saúde. A questão é saber se o Zona 2 é benéfico se comparado a outros treinos um pouco mais fáceis ou mais difíceis.

Na visão de San Millan, o treinamento nessa intensidade ensina os músculos a fazer o uso mais eficiente possível de gordura e carboidratos. Especificamente, ele acredita que o Zona 2 é o nível ideal para desencadear melhorias nas mitocôndrias, as chamadas “potências” nas células que usam oxigênio para transformar alimentos em energia.

Segundo San Millan, se você permanecer no Zona 1 as mitocôndrias não trabalharão duro o suficiente para estimular melhorias significativas. Se você aumentar para o Zona 3, o ponto em que há dificuldade para falar frases completas, os músculos passarão a queimar mais carboidratos e menos gordura. O Zona 2, portanto, é o ponto ideal.

Já está bem estabelecido que ter mais mitocôndrias – as responsáveis por organizar a respiração das células – está associado a resultados positivos, como maior sensibilidade à insulina e melhor desempenho atlético.

Mas San Millan e um conjunto crescente de outros cientistas acreditam que elas também funcionam como um prognosticador sensível de futuros problemas metabólicos: é o primeiro lugar em que os sinais de problemas aparecem no longo caminho para condições crônicas como diabetes tipo 2, doenças cardíacas e até mesmo o Alzheimer.

A prescrição para evitar tais doenças, de acordo com a teoria deles, é se exercitar no Zona 2, o que força as mitocôndrias a se adaptar e crescer.

Como você sabe que está no Zona 2?

Descobrir exatamente quanto é preciso se esforçar ou qual frequência cardíaca corresponde ao Zona 2 requer uma visita a um laboratório de fisiologia do exercício, o que não é prático nem fácil para a maioria das pessoas. Não se pode confiar nas zonas de frequência cardíaca em esteiras ou outros equipamentos de exercício, já que o sistema de seis zonas de San Millan é um dos vários sistemas de classificação diferentes, cada um com limites de zona distintos.

Outro método que ganhou popularidade entre os que buscam melhorar o desempenho usando tecnologia avançada é usar uma picada de sangue para testar seus níveis de lactato intermitentemente durante um treino. Como alternativa, é possível ignorar os dados e se concentrar na sensação de esforço do exercício.

Em seu livro, Attia descreve o esforço apropriado como sendo algo entre fácil e moderado: “Lento o suficiente para que se possa manter uma conversa, mas rápido o bastante para que a conversa possa ser um pouco tensa”. Ele sugere começar com duas sessões de meia hora por semana e progredir até que se esteja fazendo pelo menos três horas por semana no total.

O que a ciência diz?

O caso do Zona 2 depende principalmente de dados observacionais, mas os cientistas ainda não testaram essas questões em estudos de treinamento rigorosos.

San Millan vê o ritmo que se consegue sustentar no Zona 2 como uma medida indireta de quantas mitocôndrias se tem e do bom funcionamento delas. Ao longo dos anos, ele notou que aqueles que fazem mais o treinamento Zona 2 – os ciclistas profissionais são seu principal exemplo – conseguem obter resultados melhores nesse ritmo.

Mas quando os pesquisadores fazem biópsias musculares para medir diretamente a quantidade de mitocôndrias presentes, o Zona 2 não se sai tão bem, de acordo com Kristi Storoschuk, candidata a doutorado em fisiologia muscular na Universidade Queen’s, uma das poucas pesquisadoras em todo o mundo que atualmente estudam o tema.

Em vez disso, exercícios intensos bem acima do Zona 2 produzem maiores efeitos nas mitocôndrias. Essa também é a conclusão de uma revisão sistemática publicada recentemente por cientistas na Noruega e na Dinamarca, e é uma perspectiva compartilhada por muitos cientistas na área.

A eficiência da Zona 2

Se o interesse na Zona 2 levar as pessoas a presumir que o mais fácil é sempre o melhor, elas podem acabar se exercitando em uma intensidade tão baixa que suas mitocôndrias não vão se beneficiar, alertou Storoschuk.

É difícil fazer comparações de igual para igual entre diferentes tipos de exercícios, o que pode explicar essas descobertas aparentemente conflitantes. Uma hora de Zona 4 pode ter maiores benefícios de condicionamento físico do que uma hora de Zona 2, por exemplo, mas também é uma meta muito mais difícil de alcançar.

Segundo Martin MacInnis, professor da Universidade de Calgary que estuda exercícios e mitocôndrias, a verdadeira magia da Zona 2 é que ele permite que você se recupere rapidamente e volte a fazê-lo no dia seguinte – e talvez até goste de manter esse ritmo. Ele acrescentou que o melhor treino para impulsionar a saúde mitocondrial é provavelmente aquele que você está disposto a fazer regularmente.

Stephen Seiler, cientista esportivo norueguês, observou que os melhores atletas em uma variedade de esportes de resistência passam cerca de 80 por cento do seu tempo fazendo treinamento relativamente fácil e 20 por cento pegando pesado. Esse padrão 80/20 parece produzir a combinação ideal de quanto e com que intensidade se pode treinar – e, provavelmente, é uma boa receita para otimizar a saúde também.

Essa é uma perspectiva compartilhada até mesmo por San Millan, que nunca pretendeu sugerir que há apenas um tipo de treino que vale a pena fazer: “A Zona 2 é parte disso, mas você precisa variar as intensidades também.”

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