Justiça culpa vítima por divulgação de fotos eróticas e reduz indenização em 95%
Para desembargador, quem faz imagens pornográficas não tem "pudor", "moral" ou "autoestima"
Minas Gerais|Enzo Menezes, do R7

Uma garota que teve fotos eróticas divulgadas pelo ex-namorado na internet teve a indenização por danos morais reduzida de R$ 100 mil para R$ 5.000 pela 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. O desembargador Francisco Batista de Abreu, que determinou a redução, ainda considerou a vítima responsável pela atitude do ex-namorado, pois ao fazer poses nua a garota mostrou "não ter amor-próprio e autoestima". A decisão foi acompanhada pelo desembargador Otávio de Abreu Portes.
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Segundo o processo, Fernando Ruas Machado Filho e a jovem se relacionaram durante um ano, até 2008, e após o rompimento a garota concordou em enviar fotos pela webcam, ela em Uberaba e ele em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Fernando Ruas admitiu que "divulgaria o material com o objetivo de atingir a honra" da ex e repassou as imagens a colegas da Fazu (Faculdades Associadas de Uberaba).
"Poses para um quarto escuro"
Francisco de Abreu apontou que não se pode dizer que o réu foi o responsável pela divulgação e ainda analisou as imagens. Para o desembargador, fotos pornográficas não podem acontecer em um namoro curto, muito menos com a luz acesa.
No despacho, o magistrado afirma que "fotos sensuais são exibíveis, não agridem e não assustam. [As da garota] são poses que não se tiram fotos. São poses para um quarto fechado, no escuro, ainda que para um namorado, mas verdadeiro. Não para um ex-namorado por um curto período de um ano. Não foram fotos tiradas em momento íntimo de um casal ainda que namorados. E não vale afirmar quebra de confiança. O namoro foi curto e a distância. Passageiro. Nada sério"
Em outro momento, o desembargador reafirma que a vítima participou da humilhação por falta de pudor. "Concorreu ela de forma positiva e preponderante. O pudor é relevante e esteve longe (...). Quem ousa posar daquela forma e naquelas circunstâncias tem um conceito moral diferenciado, liberal. Dela não cuida".
Em primeira instância, a indenização foi fixada em R$ 100 mil. O desembargador relator, José Marcos Vieira, discordou das alegações e propôs a redução da multa para R$ 75 mil, mas foi vencido. Prevaleceu a versão de Francisco de Abreu, para quem "fotos em posições ginecológicas que exibem a mais absoluta intimidade da mulher não são sensuais".
Decisão "terrível"
O advogado de defesa da garota, Sergio Murilo Braga, recorreu da decisão.
— Ele utilizou uma visão estereotipada e preconceituosa. O limite moral entre casais é formado na relação, não é uma moral absoluta, como classificado pelo juiz. Seria o mesmo que dizer que uma mulher que usar saias pode ser estuprada.
A coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher da UFMG, Marlise Matos, classifica a decisão como "terrível".
— Não cabe ao Poder Judiciário debater a relação íntima entre quatro paredes. É assustador que um juiz tenha essa postura extremamente conservadora. Cada um tem direito a estabelecer as relações eróticas que bem entender na vida privada e tem direito à privacidade. Gostaria que esse caso subisse para cortes superiores porque é uma jurisprudência nefasta, ele julga o comportamento da vítima e estimula outros homens a ter postura semelhante.