Rio já tem o maior nº de militares do Exército mortos em intervenções
Desde 1992 o Rio de Janeiro já registrou ao menos quatro militares mortos em operações da Garantia da Lei e da Ordem — três apenas neste ano
Rio de Janeiro|Márcio Neves, do R7
Após sete meses da intervenção federal no Rio De Janeiro, o Estado é o único do país em que ocorreram morte de militares durante ações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) realizadas pelas Forças Armadas desde 1992. Já são quatro militares que morreram em ação neste período de 26 anos em que a cidade recebeu 18 operações de GLO —em eventos ou ações de segurança pública.
Três destas mortes ocorreram este ano e foram resultantes do primeiro confronto direto de militares do Exército contra suspeitos de integrarem facções criminosas. Outros 56 agentes de segurança e 103 civis foram mortos durante a intervenção federal realizada neste ano no Rio de Janeiro, segundo o Observátorio da Intervenção.
Foi também a primeira vez em que foram registradas mortes simultâneas de militares das Forças Armadas em um mesmo dia nos últimos 45 anos, decorrentes de confrontos em território nacional. Segundo um levantamento feito a pedido do R7 pelo mestre em Ciências Políticas da UFScar (Universidade Federal de São Carlos) e especialista em Política Militar João Roberto Martins Filho, desde 1973 não morriam simultaneamente militares do Exército durante uma operação em solo brasileiro — o último registro é da morte de seis militares em 25 de dezembro de 1973, durante uma ação na Guerrilha do Araguaia.
Estas duas mortes aconteceram no dia 20 de agosto deste ano. O cabo Fabiano de Oliveira Santos, de 36 anos, morreu após ser atingido no ombro por um disparo no Complexo do Alemão, já o soldado João Viktor da Silva foi baleado durante patrulhamento no Complexo de Comunidades da Penha, também na zona norte do Rio, ambos em ações das Forças Armadas em função da intervenção federal.
A terceira morte foi a do soldado Marcus Vinícius Viana Ribeiro, baleado na mesma operação em que morreram o cabo Fabiano e o soldado João Viktor. Ele foi socorrido com vida, mas morreu no hospital dois dias depois, em 22 de agosto.
Já a quarta vítima de ações de GLO foi um cabo do Exército baleado durante uma ação de GLO realizada em 2014. Michel Mikami, 21 anos, foi baleado na cabeça durante um confronto na comunidade da Maré, na zona norte do Rio.
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Militares ouvidos pelo R7 consideram as mortes incomuns, mas um risco iminentes nessas operações. Já o professor de relações internacionais da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e doutor em ciências sociais Alexandre Fuccille, a banalização do uso militar das Forças Armadas em um ambiente urbano e compatriota é "ineficiente e um risco, tanto para a população quanto para o soldado".
" [Com] essas questões de [as Forças Armadas] terem sido empregadas de forma cada vez mais banal, a criminalidade passa a saber os limites de até onde as forças militares podem operar. Fundamentalmente o preparo militar é para a guerra, para o aniquilamento, não é para segurança pública, que é, em tese, encontrar evidências, deter, recolher provas materiais e levar ao tribunal", disse Fuccille.
Alexandre pondera, no entanto, que as Forças Armadas aprenderam muitas técnicas em conduzir ações de segurança em missões internacionais como a do Haiti, mas ressaltou que a função dos militares é deturpada pelos governantes. "Isto veio acontecendo em todos os governos desde FHC, e os próprios militares são contra", afirmou.
O comandante do Exército, general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, já criticou o uso das Forças Armadas em ações para garantir a manutenção da lei e da ordem em cidades. Dias antes o então Ministro da Defesa, Raul Jungmann, também havia criticado o uso excessivo das Forças Armadas em ações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
“Não gostamos de participar das chamadas Operações de Garantia da Lei e da Ordem”, disse o general Villas Bôas durante um evento em Brasília no ano passado.
Exército lamenta as mortes
As mortes dos três militares do Exército ocorridas durante as operações no Rio de Janeiro em agosto deste ano foram lembradas pelo Comando do Exército e pela Presidência da República em uma cerimônia em que eles foram homenageados, durante uma formatura de novos cadetes em Brasília no dia 25 de agosto, poucos dias após suas mortes.
"Hoje, uma nação agradecida honra a memória dos militares que pereceram no desempenho de sua missão. […] Seu sacrifício não será em vão: cumpriremos a tarefa imperiosa de recompor a ordem pública no Rio de Janeiro”, declarou o presidente Michel Temer na época.
“Suas mortes tiveram repercussão restrita, que nem de longe atingiram a indignação ou a consternação condizentes com os heróis que honraram seus compromissos de defender a pátria e proteger a sociedade com o sacrifício da própria vida. Como eles, há soldados das três Forças Armadas que, desde a República, têm sacrificado suas vidas para que o futuro do Brasil seja diferente. É chegada a hora de dizer basta ao diversionismo e à fragmentação”, declarou o Comandante do Exército, general Villas Bôas.
Números da Intervenção