Começa hoje julgamento de ação penal que pode levar Eike Batista à prisão
Ex-bilionário é acusado de manipulação de mercado e insider trading
Economia|Vanessa Beltrão, do R7
Denúncias de manipulação do mercado financeiro e insider trading (uso de informação privilegiada) serão julgadas pela Justiça brasileira a partir desta terça-feira (18).
O réu é um ex-bilionário brasileiro que chegou a ser considerado o sétimo homem mais rico do mundo: Eike Batista.
Se condenado, o empresário, que atua nos ramos de petróleo, logística, mineração e naval, terá de pagar uma multa pesada e poderá até ir para a cadeia — algo que nunca aconteceu no Brasil para esse tipo de crime.
A denúncia do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro — acatada pela 3ª Vara Federal Criminal do Estado — narra a ocorrência de três fatos criminosos, sendo um de manipulação de mercado (pena de um a oito anos) e dois de uso indevido de informação privilegiada (insider trading, com pena de um a cinco anos, mas multiplicado por dois). Assim, se for condenado, o empresário pode ficar até 18 anos atrás das grades.
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A defesa de Eike tentou suspender a ação penal com um pedido de habeas corpus na última sexta-feira (14). O documento foi impetrado no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, mas foi negado pelo desembargador Messod Azulay na segunda-feira (17).
Pela manipulação de mercado, Eike é acusado de tentar enganar investidores ao prometer uma injeção de US$ 1 bilhão na OGX (atual OGPar), algo que nunca aconteceu. A promessa não concretizada foi entendida, à época, como uma garantia da “saúde” da empresa, o que acabou não se confirmando.
Já pelo uso de informação privilegiada (insider trading), ele é acusado de vender ações antes de divulgar para o mercado as conclusões técnicas e financeiras que atestavam que os campos de petróleo da companhia não eram viáveis economicamente.
De acordo com o titular da 3ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, juiz Flávio Roberto de Souza, a previsão é que o interrogatório de Eike Batista aconteça em janeiro, após o recesso da Justiça. Mas o ex-bilionário tem que acompanhar os depoimentos de todas as testemunhas, ou seja, é preciso estar presente às audiências, marcadas para começar hoje, às 14h.
Na audiência de hoje, serão ouvidas dez testemunhas de acusação, das 13 listadas pelo Ministério Público Federal do Rio, como explica Souza.
— Essas testemunhas de acusação são da Bolsa [de Valores] e da OGX [atual OGPar]. Da Bolsa são procuradores e auditores que atuaram no procedimento administrativo.
A defesa convocou oito testemunhas que só devem ser ouvidas também em janeiro.
Eike nega acusações
A assessoria de imprensa de Eike Batista informou que não está comentando o assunto. O R7 tentou entrar em contato com o advogado do empresário, Sérgio Bermudes, mas não obteve sucesso.
Em uma das poucas entrevistas concedidas desde a derrocada de seu império, Eike afirmou que sua intenção nunca foi a de ludibriar investidores e que nunca usou de informação privilegiada para fazer negócios.
Para o diretor da Escola de Investimentos Leandro&Stormer, Leandro Ruschel, que participou de um livro sobre o empresário, aparentemente, as regras e a lei do mercado de capitais foram desrespeitadas.
— Você, como administrador de uma empresa que tem milhares de sócios, uma empresa de capital aberto em Bolsa, tem que cumprir as regras. Tem que fazer de tudo que está ao seu alcance para tentar salvar a empresa, mas dentro das regras vigentes, dentro de uma moral correta.
Ruschel acrescenta que será bom para o mercado financeiro um julgamento técnico, veloz e justo.
— Para as pessoas se sentirem seguras na hora de investir.
Já o advogado Alexandre de Almeida Gonçalves — especialista em direito empresarial e concorrencial e sócio-diretor do escritório Almeida Gonçalves & Advogados Associados — afirma que ainda temos um longo caminho a seguir até alcançar o nível de rigidez com que são tratados, por exemplo, os crimes financeiros nos Estados Unidos. A legislação que tipifica os crimes de insider trading e manipulação de mercado no Brasil é extremamente nova, de 2001, e a primeira condenação brasileira de insider trading é de 2011 (fusão da Perdigão com a Sadia).
— Não é possível precisar quanto tempo durará a instrução do processo ou mesmo quando o juiz de primeira instância dará sua sentença. O que é certo é que, depois dele, uma das partes, ou ambas, recorrerão aos tribunais superiores. Será um longo caminho até uma decisão definitiva deste caso.
Multa e cadeia
Segundo o advogado Alexandre de Almeida Gonçalves, a pena para os crimes de manipulação do mercado e insider trading é sempre de prisão e multa, sendo que a multa pode ser, no máximo, três vezes o montante da vantagem ilícita.
É importante ressaltar que a multa é equivalente à pena aplicada. Por exemplo, se a pena máxima de um crime é de dez anos, e se o réu é condenado a cinco, a penalidade financeira será, da mesma forma, metade da multa máxima, ou seja, no caso, de 1,5 da vantagem ilícita.
Em caso de condenação, Gonçalves explica que a pena vai depender "da culpabilidade do agente, seus antecedentes criminais, sua conduta social e personalidade, além dos motivos, circunstâncias e consequências do crime, tudo para que a pena seja suficiente para reprovação e prevenção do crime".
Já a presidente da Comissão de Criminal Compliance, do Instituto dos Advogados de São Paulo, Carla Rahal, afirma que, caso ele seja condenado, dificilmente pegará uma pena máxima, por se tratar de réu primário.
— O juiz, quando ele vai fazer a dosimetria da pena, ele tem que partir de uma pena mínima. Então a pena mínima, no caso dos crimes, é de um ano de reclusão [ao todo, portanto, três anos].
Ainda de acordo com Rahal, o Código Penal ainda prevê que uma condenação de até quatro anos pode ser substituída por uma restritiva de direito, que poderia ser prestação de serviços à comunidade ou entidade pública, ou até mesmo a proibição de não atuar no mercado de capitais durante um período determinado. Somente a partir de uma pena de cinco anos é que a reclusão se torna a única opção.
O juiz Flávio Roberto de Souza comenta que, em caso de uma possível condenação, “não é improvável [a pena ficar acima de três anos]”.
— Eu penso que a pena pode ficar acima de três anos, mas o mínimo é três anos.
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