Alckmin diz que operação contra Bolsonaro ‘não pode nem deve’ levar Trump a aumentar tarifas
Ex-presidente está de tornozeleira eletrônica e sem acesso a redes sociais; Trump usou processo contra Bolsonaro para justificar taxa
Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília

O vice-presidente, Geraldo Alckmin, afirmou nesta sexta-feira (18) que a operação da Polícia Federal e as medidas cautelares impostas ao ex-presidente Jair Bolsonaro “não podem nem devem” levar o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a endurecer as tarifas impostas ao Brasil.
Alckmin também declarou que a ação do norte-americano inaugura um “precedente muito ruim” na relação entre os Poderes.
“A separação dos Poderes é a base do Estado de Direito, tanto no Brasil quanto nos EUA. Os Poderes são independentes. Isso é de Montesquieu, não é de hoje”, destacou, ao citar o filófoso francês Barão de Montesquieu, que viveu entre os séculos 17 e 18 e elaborou a teoria da separação dos Poderes.
“Não há relação entre uma questão política ou jurídica e tarifa. É até um precedente muito ruim, essa relação entre política tarifária, que é regulatória e questão de outro poder”, avaliou.
Negociações
As declarações de Alckmin foram feitas a jornalistas após encontro com parte do setor produtivo afetado pela decisão de Trump.
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Após o anúncio do norte-americano, Lula determinou a criação de um comitê interministerial para discutir a tarifa.
O grupo de trabalho é chefiado por Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, e reúne empresários e o setor produtivo.
“Tivemos uma semana de trabalho intenso, ouvindo todo o setor produtivo, a indústria, o agronegócio, o setor de energia. Hoje ouvimos o setor da mineração, que tem também interface grande com os EUA”, destacou o vice-presidente.
União nacional
Na avaliação de Alckmin, tem havido consenso entre os participantes das conversas. “União nacional em torno da soberania do país, que é inegociável. Há necessidade de empenho para o desenvolvimento, para a gente suspender esse aumento de alíquotas, que é muito ruim e é um perde-perde. Não é ruim só para o Brasil, mas também para os EUA — encarece produtos lá e leva ao aumento da inflação", acrescentou.
O trabalho do governo federal busca reverter a taxação de Trump. Desde a última terça (15), Alckmin tem se reunido com os setores produtivos impactados, além de representantes do agronegócio e de empresas norte-americanas.
Apesar do esforço, a gestão do petista não descarta aplicar a Lei da Reciprocidade, recém-aprovada pelo Congresso Nacional e regulamentada por decreto de Lula nesta semana.
O chefe do Executivo também cogita acionar a OMC (Organização Mundila do Comércio), da qual Brasil e EUA fazem parte. A entidade é responsável por regular o comércio entre os países integrantes.
“Caça às bruxas”
Em carta, enviada nominalmente a Lula na semana passada, Trump anunciou que, a partir de 1º de agosto, vai taxar em 50% todos os produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos. O texto foi publicado em uma rede social do presidente norte-americano.
Segundo o republicano, a medida é uma resposta direta a supostos ataques do Brasil à liberdade de expressão de empresas norte-americanas e à forma como o país tem tratado Bolsonaro.
Além de inelegível até 2030, o ex-presidente é réu no STF (Supremo Tribunal Federal) por tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito.
Para o líder norte-americano, o julgamento e as investigações que envolvem o ex-presidente brasileiro configurariam uma “caça às bruxas” que deveria “terminar imediatamente”.
Operação contra Bolsonaro
Na manhã desta sexta, a Polícia Federal cumpriu dois mandados de busca e apreensão na residência de Bolsonaro em Brasília.
A decisão partiu do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, que também determinou medidas cautelares ao ex-presidente, como uso de tornozeleira eletrônica e proibição de acesso a redes sociais.
Em seguida, a Primeira Turma da Corte formou maioria para manter a decisão do ministro. Após pedido de Moraes, o ministro Cristiano Zanin convocou uma sessão extraordinária virtual do colegiado para analisar a determinação.
No plenário virtual, não há discussão. Os ministros apresentam os votos de maneira remota no sistema do STF.
Em nota, a defesa do ex-presidente afirmou que recebeu com “surpresa e indignação” a imposição de medidas “severas” contra ele. Segundo os advogados, Bolsonaro sempre cumpriu as determinações do Poder Judiciário.
Na decisão, Moraes afirmou que o ex-presidente “confessa”, de forma “consciente e voluntária”, a prática de atuação criminosa na extorsão contra a Justiça brasileira, ao condicionar o fim do tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, à própria anistia.
“Não há, portanto, qualquer dúvida sobre a materialidade e autoria dos delitos praticados por Jair Bolsonaro, onde pretende, tanto por declarações e publicações, quanto por meio de induzimento, instigação e auxílio — inclusive financeiro — a Eduardo Bolsonaro, o espúrio [ilegitimo] término da análise de sua responsabilidade penal, seja por meio de uma inexistente possibilidade de arquivamento sumário, seja pela aprovação de uma inconstitucional anistia”, escreveu o ministro.
Moraes recorreu, ainda, a uma citação do escritor Machado de Assis, imortal da ABL (Academia Brasileira de Letras). “A soberania nacional é a coisa mais bela do mundo, com a condição de ser soberania e de ser nacional”, diz o trecho destacado da crônica “História de Quinze Dias”, publicada em 1876.
Moraes reforçou o argumento da soberania nacional e afirmou que ela não pode ser negociada nem extorquida, por se tratar de um dos fundamentos da República.
“O STF sempre será absolutamente inflexível na defesa da soberania nacional e em seu compromisso com a democracia, os direitos fundamentais, o Estado de Direito, a independência do Poder Judiciário nacional e os princípios constitucionais brasileiros”, destacou o ministro.
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