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'Quando fiz as contas de quanto tempo ficaríamos trancados, chorei muito', diz brasileira em Xangai

Joana Molgaard tem dois filhos pequenos e enfrenta dificuldades com o marido para comprar fraldas e alimentos

Internacional|Maria Cunha*, do R7

Brasileira está enfrentando as restrições em Xangai ao lado do marido e de seus dois filhos
Brasileira está enfrentando as restrições em Xangai ao lado do marido e de seus dois filhos Brasileira está enfrentando as restrições em Xangai ao lado do marido e de seus dois filhos

No fim de março, os 26 milhões de moradores de Xangai, na China, passaram a viver sob uma rigorosa política de confinamento imposta pelo governo com o objetivo de conter um novo surto de Covid-19, o mais grave desde o início de 2020, no país asiático. 

Para erradicar a doença, a China, que tem 90% de sua população vacinada, mantém uma política de Covid zero, provocando frustração em grande parte dos habitantes, que relataram dificuldades para comprar alimentos e outros produtos básicos. No entanto, são raras as manifestações de oposição aos controles rígidos do Estado.

A brasileira Joana Molgaard, de 38 anos, mora em Xangai desde 2019 e relata como está sendo o período de isolamento na China para ela, o marido, Thomas, e os filhos Clara, de 5 anos, e Erik, de 7 meses. Em entrevista ao R7, ela conta que não ficou muito preocupada quando foi anunciado o primeiro lockdown de cinco dias, pois jamais imaginou que o isolamento poderia durar tanto tempo.

“Minha única preocupação na época era que, devido a outros lockdowns pontuais e também ao anúncio da quarentena, estava bem difícil conseguir comida”, lembra a brasileira. “Em geral, aqui em Xangai eu faço compras online e tudo chega em 30 minutos. Na semana antes do lockdown, já estava bem difícil achar as coisas e nos dias anteriores estava caótico. As filas nos mercados eram enormes.”

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Mas o que Joana não esperava era ficar mais de um mês em quarentena, e parte desse período sem poder sair de seu apartamento, localizado no distrito de Changning, área nobre da cidade chinesa. Isso porque moradores de dois apartamentos em um prédio vizinho ao dela tiveram Covid.

“O primeiro caso foi registrado em 6 de abril. Com isso, ganhamos 14 dias de quarentena, sete em casa e mais sete podendo descer à área comum, além dos seis que já havíamos passado sem sequer sair do apartamento”, explica. “Quando fiz as contas de quanto tempo ficaríamos trancados, eu me tranquei no banheiro, liguei o chuveiro e chorei muito.”

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A brasileira revela, porém, que algo de incomum aconteceu. Apenas um dos testes realizados pelo vizinho, o PCR, deu positivo, enquanto todos os outros foram negativos. “Ele foi levado a um centro de quarentena, onde ficou por quatro dias, se não me engano. Todos acreditam que foi um falso positivo.”

Apesar disso, existem regras para testagem. Ela explica que toda a família já fez nove testes PCR em um mês e, nos dias em que não há o exame, é preciso fazer o teste de antígeno em casa.

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Covid-19 na vizinhança

Clara e os testes feitos pela família
Clara e os testes feitos pela família Clara e os testes feitos pela família

Mesmo assim, no dia 13 ou 14 de abril, outros moradores do prédio também pegaram a doença. Pai e filho em um apartamento e, em outro, uma mulher grávida de sete meses e os avós da criança. “Ganhamos mais 14 dias! Foi desesperador! Nossa possibilidade de descer à área comum foi empurrada por mais uma semana!”, relembra. 

No dia 20, o condomínio de Joana e de sua família passou a ser "área de controle“, quando não há casos nos últimos sete dias, e foi possível voltar a descer à área comum. Dois dias depois, porém, a família recebeu a notícia de que mais alguém havia testado positivo. Por causa disso, o comitê residencial, responsável por aplicar as diretrizes do governo chinês, enviou um documento que colocava todos em zona fechada novamente.

“Na hora, eu desci com a minha filha e disse que não ia me trancar de novo, pois o novo caso já estava isolado. Outros moradores se juntaram e conseguimos permanecer descendo à área comum”, relata Joana. 

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Compras coletivas

O bem-estar e a saúde dos filhos são a principal angústia da brasileira atualmente. Ela conta que, apesar de agora não estar faltando nada e de já ter se adaptado a fazer compras coletivas, no início ela não sabia como funcionava essa forma de consumo.

Joana comemora a compra de fraldas para o filho durante o isolamento em Xangai
Joana comemora a compra de fraldas para o filho durante o isolamento em Xangai Joana comemora a compra de fraldas para o filho durante o isolamento em Xangai

”Faltaram leite, frutas e o maior estresse, que foram as fraldas. Eu tenho um bebê de 7 meses e passava o dia tentando acionar o serviço de entrega, mas não tinha entregador suficiente.”

A solução foi um entregador de aplicativo, no qual as pessoas podem escolher a gorjeta que desejam dar ao trabalhador. Joana ofereceu RMB 100, aproximadamente R$ 75, e conseguiu. “Quando ele entregou as fraldas, trocamos nossos WeChat e, quando preciso de algo que não acho em compra coletiva, peço a ele para achar para mim.”

Joana e a família também recebem alguns itens do governo, porém ela diz que isso não acontece com a maioria das pessoas e que eles têm muita sorte.

Filho com febre

Joana conta que seu filho mais novo teve febre nas últimas semanas e, pelas regras, pessoas com temperatura alta só podem ser vistas pelas chamadas “clínicas de febre”, que, no momento, só existem em hospitais públicos. Além disso, para sair do condomínio, é preciso a permissão do comitê residencial e ter feito um teste PCR com no máximo 48 horas de antecedência. 

“Como eu tinha feito PCR no dia anterior ao da febre do Erik, decidi levá-lo ao médico. Marquei no hospital internacional, agendei o carro, que custou RMB 1000 (R$ 751,27), e tirei a permissão. Na manhã da consulta, dei remédio para febre pro Erik, pois se ele chegasse ao hospital internacional com febre não iriam vê-lo. Não queria ir ao hospital público por medo de ele pegar Covid ou qualquer outra doença”, conta Joana. 

Após serem atendidos por um otorrino, Erik e sua mãe foram se consultar com o pediatra do hospital. Uma enfermeira, porém, constatou que o bebê estava com febre e o hospital se recusou a examiná-lo se a temperatura não baixasse.

“Fui embora sem ver o pediatra, e foi quando me bateu o desespero. No fim, o Erik tinha roséola, que não é sério, mas e se fosse? A sensação de impotência por não poder ajudar os filhos é algo que nunca vou superar.”

Manifestações contra o isolamento

Mesmo com o sentimento de não poder ajudar as crianças e o incômodo com a situação em Xangai, assim como muitos moradores, Joana afirma que manifestações não são permitidas e a mídia chinesa não menciona as que ocorrem. ”Vemos vídeos pelo Weibo, mídia social daqui, e vídeos espalhados pelo WeChat. A censura tenta apagar, mas até conseguir já está viral.”

A esperança é o que resta para a brasileira, que afirma já ter passado por todos os estados mentais possíveis e estar encarando um dia após o outro.

“As compras coletivas se normalizaram e passamos a poder descer com as crianças. Isso deu um certo alívio. Agora, com quase 40 dias de lockdown, eu me agarrei à luz no fim do túnel. Acredito que até o fim de maio as coisas se normalizem um pouco”, finaliza a brasileira. 

*Estagiária do R7, sob supervisão de Pablo Marques

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