Países da Primavera Árabe enfrentam zona de turbulência
Protestos deram lugar à violência, que corre o risco de se intensificar
Internacional|Do R7
Derramamento de sangue no Egito, guerra civil na Síria, impasse político na Tunísia: a Primavera Árabe deu lugar à violência que corre o risco de se intensificar devido à falta de maturidade das novas classes políticas, temem os especialistas.
"Os países árabes estão entrando em um período de turbulência e de mudanças, que provavelmente será marcado por mais violência interna, polarização e concorrência regional", considera Emile Hokayem, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos.
No Egito, cerca de 900 pessoas, em sua grande maioria manifestantes que apoiavam o presidente deposto Mohamed Mursi, foram mortas em seis dias, e a violência experimentou uma nova escalada segunda-feira (19) com um ataque contra a polícia na instável península do Sinai.
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A crise varreu quase todos os ganhos da revolta contra Hosni Mubarak em 2011, "especialmente o multipartidarismo com a entrada dos islâmicos na política e as primeiras eleições democráticas", ressalta Sophie Pommier, professora de Ciências Políticas.
"O Egito está indo de encontro à parede. Os atores são incapazes de firmar um compromisso político", considera essa especialista em Egito.
O chefe do Exército e novo homem-forte do Egito, o general Abdel Fatah al-Sissi, insistiu domingo (18) que seu país não se curvará diante dos "terroristas", e o guia supremo da Irmandade Muçulmana, Mohammad Badie, acaba de ser preso.
"Se a Irmandade [Muçulmana] for dissolvida, atravessaremos uma linha vermelha", afirma Pommier.
"A grande questão é se a comunidade internacional também irá repetir seus erros, por medo do islamismo, ou baterá com o punho na mesa, dizendo aos militares que ninguém mais pode ser enganado por este tipo de estratégia", diz.
Para Emile Hokayem, as revoltas no mundo árabe "expuseram a imaturidade política das principais facções políticas", como mostra a breve experiência da Irmandade Muçulmana no poder no Egito, onde se mostrou "alienada" dos segmentos da sociedade em que deveria se apoiar.
A situação é ainda mais crítica na Síria, onde a violência provocou mais de 100 mil mortes e cerca de 2 milhões de refugiados, segundo a ONU, desde o início, em março de 2011, da revolta popular contra o presidente Bashar al-Assad que se transformou em insurreição armada.
"Ninguém pode vencer na Síria. Assad pode sobreviver a médio prazo e esperar que os seus inimigos se enfraqueçam, mas nunca será capaz de" ganhar a guerra, ressalta Emile Hokayem, que acaba de publicar um livro sobre o levante sírio.
Para ela, se um "desmembramento formal da Síria permanece improvável, uma divisão macia de fato do país em várias entidades menores [...] toma forma."
Para Nadim Shehadi, especialista em Chatham House, espera ainda mais violência na Síria e no Egito, na medida em que "os velhos regimes sabem como manipular a violência."
A Líbia também luta para recuperar a estabilidade, porque o ex-regime de Muammar Khaddafi "destruiu todas as instituições do país", segundo Shehadi.
E o impasse político também atingiu a Tunísia, onde nem a oposição nem os islamitas no poder cedem às suas exigências, apesar das negociações diretas e indiretas.
Apenas o Iêmen, único caso no mundo árabe onde a revolta levou a uma solução negociada, avança de alguma forma, sob a égide das Nações Unidas, no processo de reconciliação política.
Mas o diálogo nacional, que deveria ser concluído em setembro, estagnou em parte devido à espinhosa questão sulista, e as eleições gerais previstas para fevereiro de 2014 podem não acontecer.
"Serão necessários vários anos, senão décadas, para que a cultura política do mundo árabe reconheça que os mecanismos da democracia sozinhos não bastam e que são indispensáveis os valores da tolerância inclusão", considera Emile Hokayem.