MPDFT apura telefonema de PM para major preso no 8 de Janeiro para combinar defesa
Ministério Público deu cinco dias para Corregedoria da Polícia Militar do DF enviar uma resposta sobre o caso
Brasília|Do R7, em Brasília
O Ministério Público do Distrito Federal apura uma suposta ligação entre a tenente-coronel da PMDF (Polícia Militar do DF) Kelly Cezário e a esposa do major Flávio Silvestre de Alencar. As duas teriam combinado uma mesma linha de defesa que seria apresentada na investigação do 8 de Janeiro. O R7 tenta contato com a defesa dos militares, mas até a publicação desta reportagem, não recebeu retorno. O espaço segue aberto.
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Na ligação, Kelly Cezário teria combinado que a esposa de Flávio intermediasse um contato entre os advogados dele e os defensores do então comandante-geral da PMDF, o coronel Fábio Augusto Vieira e do ex-ajudante de ordens dele, capitão Josiel Pereira César.
Devido a suposta tentativa de manipular os depoimentos sobre os ataques na Esplanada dos Ministérios, a 3ª Promotoria de Justiça Militar requisitou que a Corregedoria da PMDF abra uma investigação do caso. O ofício foi enviado pelo órgão na quinta-feira (26) e o prazo para resposta é de cinco dias.
Relembre o 8 de Janeiro
Eram 13h de 8 de janeiro de 2023 quando um grupo de manifestantes contrários ao resultado das eleições presidenciais de 2022 iniciou uma marcha saindo do Quartel-General do Exército em direção à Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Duas horas depois, barreiras policiais foram furadas e, na sequência, as sedes dos Três Poderes, invadidas.
O caminho até o ataque aos prédios na capital federal foi construído por meses. Principal símbolo da reconstrução do regime democrático após a ditadura militar, a Constituição brasileira serviu como ferramenta dos extremistas para sustentar uma narrativa oposta à qual foi criada. Pelas redes sociais, o artigo 142 do texto foi elencado como ferramenta para permitir uma intervenção federal, a partir da crença de que o sistema eleitoral brasileiro não era seguro.
Esta interpretação, segundo a constitucionalista Vera Chemin, é equivocada. “A ideia errada era a de que as Forças Armadas teriam que garantir a ordem, mesmo que fosse às custas do rompimento do processo democrático. A Constituição brasileira baniu do ordenamento jurídico qualquer intervenção das Forças Armadas que, sob o argumento de proteção do Estado, venha a afrontar os direitos fundamentais e a estrutura governamental do Estado de Direito, da separação de Poderes e do federalismo”, explica.
A leitura correta do artigo 142 da Carta Magna, segundo Chemin, reforça que as Forças Armadas estão subordinadas ao poder de direito e ao poder civil eleito sob o manto da democracia. “As Forças Armadas têm a obrigação constitucional de defender o Estado Democrático de Direito, sob todos os aspectos. Essa é a interpretação. Elas se subordinam aos poderes constitucionais e não, aos poderes constituídos, como acontecia durante a ditadura militar.”
Ainda assim, o combinado de fake news ganhou corpo com falas do próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) questionando a lisura das urnas eletrônicas. Em reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada em julho de 2022, o ex-presidente levantou suspeitas sobre os equipamentos, sem apresentar provas, e atacou o sistema eleitoral brasileiro. Pelo fato, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu pela inelegibilidade dele até 2030, em razão de abuso de poder político.
A própria fala de Bolsonaro após ser derrotado nas urnas foi interpretada por apoiadores como aval para legitimar bloqueios em estradas, que começaram a ocorrer horas após o resultado do segundo turno, e estimular manifestações em frente a quartéis em todo o país. “Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral”, declarou o ex-presidente, quebrando silêncio de quase dois dias depois de ser derrotado nas urnas.
Organização e acampamento
Passadas as eleições, os apoiadores de Bolsonaro realizaram atos pedindo apoio das Forças Armadas para anular as eleições de 2022. Diversos quartéis foram palco dos protestos, mas foi na capital federal que os extremistas se reuniram por mais de dois meses.
No acampamento, os manifestantes tinham acesso a refeições, banheiros, energia e abrigo. O local serviu como núcleo para difundir e organizar ideias de intervenção, com direito a arrecadação de doações.
A Polícia Civil do Distrito Federal registrou 73 ocorrências de crimes relacionados ao acampamento. Entre as ocorrências, estão supostos casos de furto, crime contra a honra, lesão corporal, danos ao patrimônio e acidente de trânsito com vítima.
Entre os casos que ocorreram fora do perímetro do acampamento, mas que constam na relação de crimes associados à formação, estão a pichação de prédios públicos na Esplanada dos Ministérios; episódio de vandalismo no centro da capital em 12 de dezembro, após a prisão do indígena José Acácio Serere Xavante; e a tentativa de explosão de um caminhão-tanque em frente ao Aeroporto Internacional de Brasília.