Terremoto em Mianmar: o que se passa no país que vive uma guerra civil e foi atingido pela tragédia
Após tomada de poder por junta militar em 2021, a crise política e humanitária tem dificultado os esforços de resgate do maior desastre natural do país
Internacional|Isadora Mangueira, do R7

Mianmar, país do Sudeste Asiático com extensão territorial um pouco maior que a do estado de Minas Gerais, foi assolado por um terremoto de magnitude 7,7 na última sexta-feira (28), no que se tornou o desastre natural mais mortal de sua história.
Nesta segunda-feira (31), a nação decretou luto de uma semana pelas mais de 2.000 mortes — além de cerca de 3.400 feridos e centenas de desaparecidos. As consequências do terremoto são agravadas pela crise política que vive o país, em guerra civil desde maio de 2021.
Isolado diplomaticamente, vivendo uma crise alimentar e com uma economia agrícola em declínio, Mianmar tem 40% de sua população abaixo da linha da pobreza, de acordo com o Banco Mundial. Apesar dos esforços, o nível de destruição tem dificultado o resgate, e agências internacionais estimam que os tremores possam ter feito muito mais vítimas.
Estradas foram interditadas por conta do desastre, que derrubou a torre de controle do aeroporto da capital, Naypyitaw, e afetou serviços de eletricidade, internet e telefone. Segunda maior cidade e antiga capital do país, Mandalay é uma das mais abaladas.
Geografia
O país de 676.578 km² divide fronteiras com Bangladesh, Índia, China, Laos e Tailândia, que também foi afetada pelos tremores de terra. O maior país do sudeste da Ásia é o 40º do mundo e possui paisagem diversas, clima tropical, rica biodiversidade e depósito de minérios.
Sua densidade demográfica é considerada baixa, e a população se encontra dividida de maneira desigual pelo território. Yangon é a cidade mais populosa e mistura arquitetura dos tempos de colônia britânica com construções modernas.
Com o terremoto, o solo da região possui alto risco de sofrer liquefação — quando, devido aos tremores, a terra perde resistência.
“Ele [terremoto] faz com que esse solo mais superficial se comporte, momentaneamente, como um líquido: perde uma propriedade que a gente chama de coesão”, explica o professor Anderson Nascimento em entrevista ao Jornal da Record News.
Histórico
Após viver sob domínio britânico, em 1948 Mianmar se tornou independente diante de uma série de instabilidades políticas.
Com quase 55 milhões de habitantes, o país tem 135 minorias étnicas reconhecidas por sua Constituição. Os birmaneses são maioria e compõem 68% da população, seguidos pelos shans e pelos karens, que representam 9% e 7% do povo, respectivamente.
Em 1962, o país sofre um golpe e passa a ser governado por uma ditadura militar, que aparelha órgãos de governo. Ao longo das próximas décadas, repressão a manifestações contrárias ao regime e violações de direitos humanos se tornam características da sucessão de regimes autoritários.
A partir de 2011, o país vive uma tentativa de democratização, que não afasta totalmente os militares do poder.
Conflitos étnicos ganham força, e uma onda de violência deixa vítimas. Os principais afetados são os muçulmanos rohingya, vítimas de limpeza étnica segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).
Eleições gerais são realizadas em 2015, e o partido de oposição, LND (Liga Nacional para a Democracia), conquista maioria absoluta de assentos no parlamento.
Os assentos garantiriam a presidência, mas sua líder, Aung San Suu Kyi, é constitucionalmente impedida de assumir o cargo em razão de possuir filhos estrangeiros. Nobel da Paz e filha de um herói da independência, Suu Kyi é um ícone do movimento democrático de Mianmar, o que a fez vítima de perseguições e prisões ao longo dos anos.
Guerra civil
O que agora soma quatro anos de um conflito sangrento foi desencadeado por um novo golpe militar, quando o Tatmadaw (as Forças Armadas do país) depôs o governo eleito e formou uma junta militar. Opositores foram detidos após os militares alegarem fraude eleitoral e consolidarem a tomada de poder em 2021.
Manifestações antigolpe são duramente reprimidas, o que levou à criação do grupo armado Força de Defesa do Povo, sob comando do paralelo Governo de Unidade Nacional, que organiza a resistência civil. Em meio à tragédia recente, um cessar-fogo unilateral foi anunciado pelos rebeldes para facilitar os esforços em prol das vítimas.
Dura realidade
A destruição que assola o país ainda debilita o sistema de saúde, segundo relatório da ONU. A escassez de suprimentos tem dificultado os esforços de resposta — e mesmo a ajuda internacional tem sido complicada pela situação dos aeroportos. À agência Reuters, moradores denunciam a falta de assistência do governo até então.
A junta militar tem pedido doações a países ou organizações que queiram contribuir com o resgate, e Rússia, Hong Kong, China, Nova Zelândia e Coreia do Sul são alguns dos que se manifestaram em apoio aos socorros. Donald Trump confirmou a colaboração dos Estados Unidos, e a União Europeia também promete apoio.