Bar no DF furta energia equivalente ao consumo de 1,4 mil casas
Neoenergia realiza operação para identificar fraudes em estabelecimentos comerciais na cidade
Brasília|Jéssica Moura, do R7, e Pedro Canguçu, da Record TV
Uma ação da distribuidora Neoenergia identificou que o bar Responsa, localizado na quadra 202 da Asa Sul, furtou energia elétrica suficiente para abastecer 1.400 casas durante um mês. Depois que a fraude foi confirmada, a empresa regularizou a situação. No entanto, uma denúncia foi registrada junto à Polícia Civil. Em nota, Gustavo Leal, um dos responsáveis pelo bar, afirmou que a administração do estabelecimento não tinha ciência da situação. Ainda de acordo com Leal, "medidas administrativas e judiciais já estão sendo tomadas, visto que [segundo ele] os atos imputados não foram realizados pelo Responsa".
No início de julho, a Neoenergia deflagrou a Operação Happy Hour para investigar suspeitas de irregularidades e furto de energia no comércio do Distrito Federal. O Centro de Inteligência da Neoenergia mapeou os endereços suspeitos por meio de sensores do fluxo de energia na rede de distribuição.
Leia também
Com isso, identificou que o consumo do bar em questão não tinha sido aferido. A empresa ressaltou que os chamados gatos de energia podem prejudicar a rede elétrica e provocar até mesmo a interrupção no abastecimento da rede.
O Código Penal descreve que "equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico". Com isso, a fraude é tipificada como furto e a pena para os condenados pode chegar a oito anos de prisão. O furto de energia é crime previsto no artigo 155 do Código Penal Brasileiro, com pena de até oito anos de reclusão pela prática ilegal.
Energia furtada no país equivale ao consumo anual do Paraná
A quantidade de energia elétrica furtada no Brasil em 2020 por meio de ligações clandestinas seria suficiente para abastecer por um ano o estado do Paraná, o quinto mais populoso do país, com 11,5 milhões de habitantes. As distribuidoras estimam uma perda de receita de R$ 3,3 bilhões anuais com esse tipo de fraude, de acordo com dados da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica).
Entidades do setor e especialistas ouvidos pelo R7 afirmam que a prática ocorre em todas as camadas da sociedade — em locais de vulnerabilidade social, em endereços de luxo, no comércio e na indústria. Para combaterem esse tipo de crime, as empresas apertam a fiscalização e promovem a regularização de pontos de consumo clandestinos.
No Distrito Federal, por exemplo, a Neoenergia, distribuidora local, fez 33 mil ações de fiscalização no ano passado e regularizou 21 mil pontos de consumo. De acordo com o gerente de gestão de receita da Neoenergia, Luiz Paulo Marinho, a companhia recuperou, de março a setembro de 2021, R$ 97 milhões em energia furtada — o equivalente a 150 GWh, ou oito dias de consumo da capital federal, que tem pouco mais de 3 milhões de habitantes.
Riscos
Além dos prejuízos, os gatos oferecem riscos. Um levantamento da Abracopel (Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade) revela que 764 pessoas morreram no Brasil vítimas de incidentes com energia elétrica em 2020, das quais 237 em decorrência de acidentes relacionados à rede aérea de distribuição, 36 a postes de áreas urbanas ou rurais e 26 a incêndios por sobrecarga na fiação.
O professor Rafael Amaral Shayani, do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade de Brasília, destacou ao R7 que a prática do gato põe o usuário em risco em diversas situações. Uma delas é a instalação. “O poste tem três fios em cima, de alta-tensão, de 13.800 W. Se a pessoa encostar ali, morrerá. Um pouco abaixo, tem quatro fios de 220 W. E são muito próximos da alta-tensão. Existe um risco de vida”, alertou.
Nas residências, o risco é de incêndios causados por curto-circuitos. “A distribuidora coloca um disjuntor no relógio. Se tem um curto, o disjuntor cai. Ele para o curto. Quando você liga [a fiação] antes do medidor, se der um curto, não tem disjuntor, e isso pode causar um incêndio na residência de quem fez o gato. E tem um dispositivo de segurança, o DR, um disjuntor diferencial residual. Quando alguém encosta no fio elétrico, ele desliga antes do choque. E, quando tem gato, não tem isso. O risco de eletrocussão é muito maior”, disse Shayani.
Fiscalização
O combate ao furto de energia é difícil, e os criminosos se aproveitam das brechas que encontram para não ser pegos. Muitas vezes, quem furta energia faz as ligações clandestinas à noite e “desliga” o gato durante o dia. Os mais ousados deixam para retirar a fiação apenas na véspera da visita agendada pelo técnico da distribuidora.
Diretor jurídico e institucional da Abradee, Wagner Ferreira afirma que falta a presença do Estado para coibir a prática do gato. “Temos uma punição criminal para esse tipo de prática, previsto no Código Penal, mas não tem um tratamento, uma presença dos órgãos de Estado nesse tema”, disse.
“Quem fiscaliza, identifica a fraude e recupera essa energia fraudada? É a distribuidora. Ela é que vai à área, seja uma casa grande, simples, em uma região de milícia, e quem faz isso é o técnico da distribuidora. No caso das pessoas mais pobres, elas não furtam porque querem. Precisam pagar outras contas. Você identifica em um dia e, no dia seguinte, o furto é recolocado, algumas vezes de forma até sofisticada. Não tem Estado, policiamento, orientação. [A distribuição de energia] É um papel exercido pela iniciativa privada, em nome do Estado, e isso faz com que as pessoas não atentem para a seriedade de um furto como esse”, afirmou.