Em protesto, estudantes cobram responsabilidade do poder público sobre tragédia em Santa Maria
Grupo realizou manifestação na tarde desta terça-feira e pediu por Justiça
Cidades|Da Agência Brasil
Muita emoção e pedidos de justiça marcaram o protesto de estudantes nesta terça-feira (29) em Santa Maria. Amigos dos jovens que morreram no incêndio na boate Kiss organizaram pelas redes sociais a manifestação que saiu da Câmara de Vereadores da cidade, passou pela delegacia que cuida das investigações e foi até a prefeitura.
Acusando as autoridades e especialmente a prefeitura de omissão, os estudantes cobraram investigação transparente, punição rigorosa para os culpados e a construção de um memorial em homenagem aos mortos no lugar onde existe o prédio destruído da boate.
A organização do protesto começou com uma mensagem indignada do estudante Pablo Bizzi Mahmud, de 19 anos, que postou em uma rede social um texto cobrando a responsabilização do poder público pelo acidente. "Quando vi que os sócios da boate e os integrantes da banda tinham sido presos, publiquei que o poder público também devia ser punido. Eles têm que responder por essa tragédia. Quanto tempo vamos precisar esperar para ver o poder público agir e evitar esse tipo de coisa?", cobrou o estudante.
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Ao longo do percurso, diversas pessoas deram depoimentos em que lamentavam a perda de amigos, parentes e colegas de universidade. A professora Luciana Montemezzo, do curso de letras da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), lembrou dos colegas que lecionam no curso de Agronomia, que reúne a maior quantidade de mortos.
— Como professora da UFSM, eu perdi alunos e filhos de alunos. Fico pensando nos meus colegas da Agronomia, que perderam mais de 20 alunos em uma turma de 40.
O presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Daniel Iliescu, compareceu ao protesto e ofereceu apoio e solidariedade aos estudantes.
— Esse potencial de futuro que foi ceifado atinge não só Santa Maria, mas toda a pátria, todo o Brasil. Santa Maria não está sozinha hoje.
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Os vereadores receberam carta dos estudantes em que são cobradas providências para que os responsáveis sejam punidos. O vereador Coronel Vargas (PSDB) disse que já foi feita reunião entre a mesa diretora da Câmara de Vereadores na qual surgiu a proposta de revisão das leis que tratam da fiscalização de casas noturnas. Ele se disse satisfeito com a mobilização da juventude.
— Julgamos que este manifesto é muito importante porque os jovens são os usuários dessas casas noturnas. Nós precisamos que eles nos ajudem a fiscalizar, eles sabem o que tem de errado lá. É importante que a gente tenha essa corresponsabilidade.
Na frente da Delegacia Regional de Polícia Civil de Santa Maria, os jovens gritaram por Justiça e pediram minúcia nas investigações. Emocionado, o delegado que cuida do caso garantiu que tudo será feito com o maior rigor possível.
— Estamos trabalhando incessantemente, quase sem dormir, desde a ocorrência. Eu também perdi uma prima lá. Vamos apurar as responsabilidades, podem ter certeza disso.
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Quase ao mesmo tempo em que o protesto percorria as ruas de Santa Maria, o prefeito fez pronunciamento à imprensa no qual apresentou documentação que ele diz comprovar a fiscalização na casa noturna no ano passado. Cezar Schimer, no entanto, não quis responder a perguntas dos jornalistas e saiu sem dar mais esclarecimentos sobre a atuação da prefeitura para evitar o acidente.
Incêndio
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, a 290 km de Porto Alegre, aconteceu na madrugada de domingo (27) e deixou mais de 230 mortos e mais de cem feridos. O fogo teria começado quando a banda Gurizada Fandangueira se apresentava. Segundo testemunhas, durante o show foi utilizado um sinalizador — uma espécie de fogo de artifício chamado "sputnik" — que, ao ser lançado, atingiu a espuma do isolamento acústico, no teto da boate. As chamas se alastraram em poucos minutos.
A casa noturna estava superlotada na noite da tragédia, segundo o Corpo de Bombeiros. Cerca de mil pessoas ocupariam o local. O incêndio provocou pânico e muitos não conseguiram acessar a única saída da boate. Os proprietários do estabelecimento não tinham autorização dos bombeiros para organizar um show pirotécnico na casa noturna. O alvará da casa estava vencido desde agosto de 2012.
Ao entrar na boate Kiss, para socorrer as vítimas do incêndio, os integrantes da corporação se depararam com uma barreira de corpos.
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O comandante-geral do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul, coronel Guido Pedroso de Melo, descreveu a situação.
— Os soldados tiveram que abrir caminho no meio dos corpos para tentar chegar às pessoas que ainda estavam agonizando.
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Esta é considerada a segunda maior tragédia do País depois do incêndio do Grande Circo Americano, em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. Em 17 de dezembro de 1961, o circo pegou fogo durante uma apresentação e deixou 503 mortos.
Prisões
Um dos donos da boate Kiss e dois músicos da banda foram detidos. Os pedidos de prisão, de caráter temporário de cinco dias, foram decretados pelo juiz Regis Adil Bertolin.
Na tarde de segunda-feiram, outro sócio da casa noturna se entregou à polícia. Ele se apresentou no 1º DP (Distrito Policial) de Santa Maria e não falou com a imprensa.