Mudanças da Meta podem dificultar controle de desinformação, conclui audiência
AGU promoveu, nesta quarta-feira (22), audiência para discutir mudanças na política de checagem da big tech
Brasília|Rute Moraes, do R7, em Brasília

As mudanças na política de checagem da Meta (dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) podem aumentar a disseminação de notícias falsas e do discurso de ódio. Essa foi algumas das falas de especialistas convidados pela AGU (Advocacia-Geral da União) para debater a decisão da big tech, nesta quarta-feira (22).
Para a gama de 45 debatedores, entre integrantes do governo, representantes de plataformas digitais e agências de checagens, a substituição da política de checagem pelo sistema de “notas da comunidade” pode ainda acelerar as divisões políticas, o ódio religioso, racial entre outras coisas.
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Conforme os especialistas, a alteração promove uma “escalada anti-jornalismo”. Além disso, eles explicaram que, apesar de as alterações, inicialmente, se aplicarem apenas aos EUA, terão “consequências imediatas em todo mundo”.
Tai Nalon, fundadora e diretora executiva da agência Aos Fatos, destacou que os comentários da Meta sugerem que os verificadores de conteúdo foram responsáveis por censura, mas explicou que a big tech nunca deu às agências tal “capacidade e autoridade” contra contas nas redes.
Ela disse ainda que a agência verificou que, agora, frases como “Os brancos são os melhores” e “Eu odeio os negros” estão “autorizadas a circular no Instagram e Facebook no Brasil e no mundo”. Tai ressaltou que moderação de conteúdo não é censura ou ataque à liberdade de expressão.
A professora de direito Mariana Valente, diretora do InternetLab, reconheceu que pode haver erros nas políticas de checagens, mas destacou que a alternativa escolhida pela Meta foi um “descompromisso declarado”.
A especialista apresentou alternativas que a big tech poderia ter tomado ao invés de acabar com a política de checagem, como: investir em melhorias, deixando os filtros mais afinados e precisos ou priorizar investimentos na moderação de conteúdo feita por pessoas.
“Isso é muito alarmante da perspectiva de garantias de direitos. É um novo pacto, uma nova gramática, um compromisso novo, ou um descompromisso declarado”, observou.
Os especialistas defenderam, entre as soluções, a aprovação do PL 2630/2020, conhecido como PL das Fake News, que tramita na Câmara dos Deputados atualmente. Em suma, o texto regulamenta as redes sociais no Brasil, mas é alvo de discordância no Parlamento.
Além disso, que o governo pode promover uma “governança digital”, por meio de uma lei aprovada pelo Congresso, sobre conteúdos digitais e políticas de moderação.
Apesar de ter sido convidada para o debate, a Meta não compareceu, mas tem até a sexta-feira (24) para enviar informações que contribuam com o debate, segundo a AGU.
No início da audiência, o ministro da AGU, Jorge Messias, disse que o governo federal não faz “pré-julgamento” das redes sociais, mas que preza por um ambiente seguro para a população brasileira.
O órgão informou que vai levar as informações debatidas e ideias dos especialistas ao STF (Supremo Tribunal Federal) para que a corte “compreenda o fenômeno que está em curso” e decida melhor sobre o tema. As informações também devem ser disponibilizadas ao Congresso Nacional e à sociedade em geral.
Entenda
Em 7 de janeiro, o empresário Mark Zuckerberg anunciou as mudanças na empresa. As alterações previstas para as plataformas passam por novas políticas ligadas à checagem de fatos e buscam flexibilizar a moderação de conteúdo. Nem todas as regras serão aplicadas no Brasil, conforme reiterou a Meta, mas são novas diretrizes que podem trazer riscos ao espaço digital, pela avaliação de especialistas.
Zuckerberg deseja inserir nas plataformas as “notas da comunidade”, a exemplo de como é feito no X. Hoje, agências e empresas de checagem fazem a análise de informações publicadas nas plataformas. O executivo também informou que Facebook, Instagram e Threads vão voltar a permitir a recomendação de conteúdos relacionados a temas políticos. O CEO destacou que as alterações vão entrar em vigor gradualmente.
O serviço de checagem de fatos ocorre desde 2016, sendo feito por jornalistas e especialistas em cerca de 115 países. O processo apura se a informação que circula na plataforma é verdadeira ou falsa e oferece a contextualização ao usuário.
Em seguida, a Meta liberou a possibilidade de ofensas preconceituosas nas plataformas. Partes do documento da companhia norte-americana permitem que se faça no Facebook, Instagram, WhatsApp e Threads — desde que de “forma satírica” — a livre associação de homossexuais e transgêneros a termos como “esquisitos”. Esse trecho aparece na versão brasileira também.
Diante do cenário, o governo acionou a Meta para saber se as mudanças seriam adotadas no Brasil. Em resposta, a empresa de Zuckerberg informou que as alterações visam “diminuir o exagero na aplicação de nossas políticas e reduzir erros”, e que alterações ligadas à moderação de conteúdos ficarão por ora restritas aos Estados Unidos — sem modificar a forma de funcionamento no Brasil.
A posição de resposta à AGU foi mais branda do que anunciado inicialmente por Zuckerberg, mas também traz impactos ao ambiente digital. No Brasil, passou a valer uma nova política na restrição de conteúdos: parte das publicações que ferem os termos de uso não será mais removida imediatamente, como antes acontecia. O tema, então, virou embate entre a Meta e o Executivo.