Dez anos após Acordo de Paris, mundo lida com desafio de limitar aumento da temperatura
No mesmo ano que o acordo completa 10 anos, o Brasil receberá pela primeira vez uma Conferência do Clima
Internacional|Thays Martins, do R7, em Brasília
O mundo se despede de 2024 com o marco de esse ter sido o ano mais quente da história, segundo o observatório europeu do clima, Copernicus. As mudanças climáticas estão cada vez mais evidentes com eventos extremos ao redor do planeta. Em meio a esse cenário, o ano que começa marca os 10 anos do Acordo de Paris, com um desafio a mais para o Brasil: receber a COP30.
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Considerado um dos mais importantes tratados em relação às mudanças climáticas, o Acordo de Paris estabelece como principal meta limitar o aumento da temperatura média global a 1,5°C ou abaixo de 2°C em relação aos níveis pré-industriais.
No entanto, segundo o professor da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, e membro do grupo de pesquisa Ambiente e Sociedade do IEA-USP Eduardo Gonçalves Gresse, esse segue sendo o principal desafio das 195 Partes (194 Estados mais a União Europeia) que assinaram o tratado.
Pelo menos três estudos feitos pelo Centro de Excelência “Climate, Climatic Change, and Society”, com sede na Universidade de Hamburgo, do qual Gresse faz parte, chegaram à conclusão de que se o mundo continuar do mesmo jeito que está “não é plausível” limitar o aumento da temperatura a 1,5°C.
“Apesar de ainda ser tecnicamente possível, este cenário não é plausível, pois há uma série de processos sociais que limitam a possibilidade de alcançarmos uma descarbonização profunda até 2050, que é uma condição necessária para atingirmos os objetivos do Acordo de Paris”, destaca.
Segundo ele, entre os processos sociais que afetam negativamente a possibilidade de atingir o objetivo estão os padrões globais de consumo e produção, bem como as “insuficientes e/ou inadequadas” respostas corporativas à crise climática e o enfraquecimento no desinvestimento em combustíveis fósseis e, ao mesmo tempo, o recente aumento na aposta nesses combustíveis.
Um estudo publicado na Nature Climate Change também declarou a meta como “perdida”. De acordo com a pesquisa, a Terra já estaria 1,7ºC mais quente em 2022 do que estava nos níveis pré-industriais.
Desafios são gigantes
De acordo com o professor Gresse, as metas do Acordo de Paris estão conectadas uma às outras, e o mundo ainda não está focado o suficiente em medidas para alcançá-las.
“A grande maioria dos países e sociedades ainda enfrentam enormes problemas estruturais e dificuldades para implementar políticas climáticas integradas e modelos de desenvolvimento que sejam sustentáveis, ou seja, que considerem de forma equilibrada as dimensões sociais, políticas, culturais, econômicas e ambientais”, destaca.
Segundo ele, é preciso assegurar uma ampla distribuição de recursos para uma significativa redução das desigualdades sociais, além de garantir uma transição ecológica justa. “Vale enfatizar que políticas climáticas não são apenas políticas ambientais, mas sobretudo políticas de bem estar social, pois têm implicações para a economia, política e saúde do planeta e da humanidade”, explica.
Brasil no centro da discussão
Em meio a esse cenário, o Brasil recebe em novembro de 2025 a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025). O evento será em Belém, e a expectativa é que o Brasil consiga retomar um protagonismo ambiental no cenário internacional.
“O Brasil está correndo contra o tempo perdido. Após anos de desmantelamento das políticas ambientais, o governo atual retomou programas e políticas públicas fundamentais para a ação climática, como o amplo monitoramento e combate ao desmatamento na Amazônia. Esses esforços já mostraram resultados expressivos em um curto período”, destaca Gresse.
Segundo ele, no entanto, o país ainda tem muitos desafios. “No âmbito internacional, o Brasil reassumiu protagonismo, demonstrando a intenção de liderar pelo exemplo. No entanto, desafios estruturais significativos ainda precisam ser enfrentados”, afirma, citando, por exemplo, o “descompasso entre desenvolvimento econômico e a sustentabilidade ambiental”.
Para ele, a COP no Brasil terá, ainda, que lidar com os conflitos e frustrações deixados pelas COPs anteriores, além de ter um foco maior em uma transição ecológica justa.
“Ao trazer as negociações e os holofotes do mundo todo para a Amazônia brasileira, o governo brasileiro tem a ambição, mas também a grande responsabilidade, de mostrar resultados concretos em termos de ação climática e de liderar a governança global rumo a um novo modelo de desenvolvimento”, afirma.