Monitoramento de espiões estrangeiros no Brasil está suspenso por cortes na Abin
Orçamento da agência é o menor em 8 anos. Viagens para missão de servidores foram cortadas, mas diretor-geral vai para Austrália com verba da agência, às vésperas de sair relatório da PF que o envolve

“Um verdadeiro desmonte”, classificam fontes sobre a situação da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin. Operações de contrainteligência, que monitoram e impedem espionagem estrangeira no país, além de buscas de interesse do Estado, foram prejudicadas pelos cortes. Sob anonimato, servidores confirmam que vários serviços estão suspensos desde o ano passado.
Com uma previsão orçamentária de R$ 127 milhões no fim de 2023, a agência passou por 2024 com o orçamento real de R$ 69 milhões, o menor dos últimos oito anos. A sede do órgão, que fica em Brasília, tem duas portarias. Uma delas foi fechada por falta de dinheiro para pagar os funcionários. Uma fonte declarou que “vários espiões estrangeiros que trabalham em Brasília estão atuando livremente”.
Viagens para missões e operações também estão paralisadas na Abin, mas o Diário Oficial da União do último dia 7 trouxe uma autorização de viagem ao diretor-geral da Abin, Luiz Fernando Corrêa. Corrêa vai para a Austrália às vésperas de um inquérito da Polícia Federal que investiga o uso ilegal da agência ser finalizado.
O suposto desmonte do órgão pode causar problemas ao Estado brasileiro. Entre as atribuições da Abin estão: serviço de espionagem para evitar sabotagem, interferências externas, ações contra a soberania nacional, ataques cibernéticos, terrorismo, bens de uso dual e tecnologias sensíveis, armas de destruição em massa, crime organizado, ações contrárias ao Estado Democrático de Direito e corrupção.
O monitoramento da agência é feito para munir de informações o Estado brasileiro, seja pela pessoa do Presidente da República, de governantes estaduais, ou órgãos responsáveis para tomadas de decisão.
Um exemplo de trabalho feito pela Abin foi quando, nos jogos Olímpicos de 2016, monitoraram uma rede de terrorismo que pretendia cometer atos no Brasil naquele período. A informação foi repassada para a Polícia Federal, que prendeu pelo menos dez suspeitos de planejar ataques no Rio de Janeiro, no âmbito da Operação ‘Hashtag’.
Outro monitoramento feito pela Abin e informado ao governo para tomada de decisões foi o de que em 2022 caminhoneiros pretendiam fechar as estradas, impedindo passagem de veículos e distribuição de alimentos para os municípios. A projeção de mortes da Covid também chegou à Presidência da República cedo, já no começo de 2020, e foi a mais assertiva de toda pandemia. Mas o governo federal, no período, não deu a atenção.
A crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos causada em 2013, quando o site Wikileaks revelou que números de telefone e até o avião da Presidente Dilma Rousseff eram alvos de espionagem norte-americana, evidenciou um problema no país — a contrainteligência.
A legislação brasileira de inteligência tem como fundamento a Lei no 9.883, de 1999, que criou a ABIN e instituiu o SISBIN (Sistema Brasileiro de Inteligência). No Congresso, também foi criada a Comissão de Controle de Atividade de Inteligência, para acompanhar e deliberar sobre a atividade de inteligência no país., mas os espiões da Abin, no entanto, lutam até hoje por uma reforma legal da atividade.
Enquanto espiões de diversas nacionalidades atuam infiltrados dentro de países para saber dados sensíveis, desde produção agrícola a informações de empresas estratégicas de energia, os espiões brasileiros não têm autorização para quase nada.
Veja o que podem ou não podem os espiões de cada país:
Estados Unidos, Israel, França, Reino Unido, Rússia, China, Irã, Venezuela, asseguram aos seus profissionais de inteligência:
- Proteção das identidades dos agentes;
- Identidades frias para as missões;
- Podem fazer interceptação telefônica e de equipamentos eletrônicos;
- Podem se infiltrar;
- Podem entrar em locais suspeitos para operações;
- Podem realizar ataques cibernéticos;
- Realizar operações no exterior
Outros países como Perú, Argentina, Espanha, Canadá podem quase todas essas coisas, mas mediante autorizações prévias.
No Brasil, os espiões da Abin não podem usar documento falso, não podem fazer interceptação telefônica, não podem se infiltrar, nem entrar em locais suspeitos, não podem realizar ataques cibernéticos e operações no exterior precisam de relatórios de justificativa e autorização, assim como a proteção de seus nomes ser relativa.