Nova âncora fiscal deve incluir aumento de despesas e preocupa especialistas
Governo precisa incluir gastos com compensação dos estados pela perda de arrecadação do ICMS e impactos com desonerações
Brasília|Do R7, com informações da Agência Estado
A nova âncora fiscal a ser apresentada pelo governo federal ao Congresso ainda em março contempla uma série de aumentos nos gastos públicos, o que, na avaliação de especialistas, pode ser motivo de entraves para consolidar a nova política. Por outro lado, a indicação do secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, é de que a proposta traz uma regra de controle de gasto, o que refletiu positivamente no mercado.
Por enquanto, o volume desses gastos para os próximos anos ainda não está definido, mas o custo fiscal pode chegar a R$ 100 bilhões por ano. O cálculo inclui despesas como a compensação a Estados e municípios para aprovação da reforma tributária e o repasse pelo governo federal das perdas com a desoneração do ICMS.
O valor considera, ainda, o impacto para os próximos anos da nova política de reajuste do salário mínimo, da correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) e do fundo de estabilização de preços dos combustíveis para a Petrobras, além dos recursos necessários para os fundos garantidores do programa de renegociação de dívidas (que será batizado de Desenrola) e de estímulo ao crédito.
"Como é que se desenha a regra fiscal quando tem um volume de despesas muito abrangente? Como garantir que o resultado primário vai melhorar?", questiona Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV. "É uma notícia fiscal nova a cada dia com impactos difíceis de serem mensurados. É uma coisa que pode atrapalhar."
O projeto do novo arcabouço fiscal será encaminhado em março ao Congresso pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e é apontado como crucial para o início do processo de redução da taxa de juros pelo Banco Central (BC).
Despesas altas
Ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Pires diz que esse quadro pode levar o governo a ter de discutir de antemão uma série de excepcionalidades à regra num cenário em que o patamar de despesas pode variar de 18,5% para 20% do Produto Interno Bruto (PIB). "São todos assuntos que precisam de solução, e o governo está atento para isso, mas essas incertezas dificultam o planejamento e o desenho da regra nesse momento", alerta o economista do Ibre.
O ponto central da discussão é como definir a trajetória para a relação entre a dívida pública e o PIB no médio e longo prazos diante de um volume de despesas tão abrangente e ainda não calculado.
O secretário-executivo da Fazenda afirma que o projeto de novo arcabouço fiscal terá uma regra de gastos, mas ao mesmo tempo será flexível para suavizar os efeitos do ciclo econômico. Isso significa evitar que, em momentos de queda da atividade econômica, o governo tenha de cortar despesas - e, em situações de bonança, fique tentado a gastar mais. Galípolo sinalizou também que o governo pretende fixar um limite para as despesas quando a arrecadação estiver aumentando.
"Essa informação (de que haverá uma regra de controle de gastos) vem para ajudar na discussão, porque ajuda a criar um espaço para reduzir os juros", diz Pires.
No exterior
O economista destaca que os países mais avançados em novas regras de controle das contas públicas têm adotado a visão de que o espaço fiscal (para despesas) é uma noção que muda dependendo das condições da economia: juros, crescimento e evolução da arrecadação e dos gastos ao longo do tempo.
Diante do cenário de projeções que apontam para uma trajetória crescente de dívida, por exemplo, a recomendação seria um orçamento mais apertado para fazer um ajuste fiscal ao longo desse ciclo de planejamento governamental via redução de despesa ou aumento de impostos.
Se o resultado fiscal melhorar, o governo pode fazer um orçamento um pouco menos apertado, aumentando as despesas. Esse modelo, em tese, daria mais flexibilidade para rever o cenário em vez de fazer uma regra fixa por 10 anos.
Segundo Pires, esse é o princípio que a Nova Zelândia está aplicando, e que o Fundo Monetário Internacional está recomendando para os países da zona do euro.
Na avaliação do economista, a regra fiscal dá mais previsibilidade para abrir espaço na redução dos juros. Pires pondera, ainda, que o projeto fiscal é mais urgente do que a reforma tributária diante da necessidade do governo de elaborar o projeto de Orçamento com a nova regra fiscal sem obedecer o teto de gastos, que será revogado com o novo arcabouço fiscal.