Entenda em sete pontos a crise mundial dos ovos
Fatores climáticos no Brasil, surto de gripe aviária nos EUA e escassez de grãos na Europa afetaram o preço do produto
Internacional|Victor Hugo Mendes, do R7

Os ovos se tornaram um dos alimentos mais afetados pela inflação global, entretanto, o aumento de preço ocorre por conta de aspectos distintos em cada mercado ao redor do mundo. Embora muitos países enfrentem problemas com a demanda, os mercados tentam superar diferentes questões.
Na Europa, a recém-intitulada “inflação do ovo” é afetada tanto pela gripe aviária quanto pelo aumento dos preços dos grãos, impulsionado pela guerra entre Rússia e Ucrânia.
No Brasil, fatores climáticos, preço do grão, realocação da produção de ovos e também a sazonalidade influenciam no encarecimento dos ovos na prateleira.
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Já os Estados Unidos têm como principal vilão para os preços elevados a gripe aviária, responsável por matar milhões de galinhas produtoras nas granjas norte-americanas.
O R7 ouviu especialistas para explicar em sete pontos a crise mundial de ovos.
Surto de gripe aviária
Desde 2022, os Estados Unidos e países da Europa vêm atuando no combate ao surto de gripe aviária em suas granjas. A doença foi responsável pelo sacrifício de milhões de galinhas produtoras no mundo todo.
Para o professor do Departamento de Economia da FEA - USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade - Universidade de São Paulo) Ivan Salomão, o resultado do surto de gripe aviária nos Estados Unidos gerou um impacto nos demais mercados pelo mundo.
“Os Estados Unidos enfrentam uma crise de gripe aviária, eles são os maiores consumidores de ovos do mundo, a gripe matou milhões de aves produtoras e, como resultado, começaram a importar ovos de outros mercados como Europa (também afetada pelo surto) e o Brasil”, diz.
Importação de ovos pelos EUA
Por consequência da escassez de ovos, o mercado norte-americano passou a importar o produto de outros mercados, como o brasileiro (seu concorrente), a fim de repor o estoque nas suas prateleiras.
Com o pagamento em dólar, o mercado norte-americano consegue convencer produtores de outros países, como o Brasil, a venderem para os Estados Unidos. Isso acaba gerando uma redução na oferta de ovos nos países em que as granjas exportadoras estão localizadas.
Salomão aponta que a realocação de produtos passou a ser atrativa para os produtores de granja, já que o recebimento em dólar supera o faturamento em seu país de origem. “No Brasil, houve um aumento de 90% de exportação para o mercado norte-americano”, afirma.
Segundo o economista do Terraço Econômico, Caio Augusto, a produção de ovos no Brasil ficou ainda mais cara com a entrada dos Estados Unidos no mercado comprador.
“A nossa produção, que já não está tão regularizada e normalizada por conta de questões climáticas (chuvas e altas temperaturas), fica ainda mais complicada quando aparece um comprador tão grande quanto os EUA pagando em dólar”, afirma Augusto.
Crise na Europa
Grande parte da produção europeia de ovos não sai de seu próprio território. A Itália, por exemplo, tem a sua capacidade de produção de ovos limitada e somente produz o suficiente para suprir as necessidades nacionais.
Outro fator importante é a escassez de grãos, agravada pelo conflito entre Rússia e Ucrânia. A guerra trouxe limitações para todo o continente, e o milho é parte da produção de ração para as galinhas produtoras de ovos.
Fator sazonal
Além da crise de gripe aviária, existe um fator sazonal que afeta o estoque de ovos.
“O aumento do preço das bandejas dos ovos tem relação direta com o momento que o país está vivendo. A chegada da quaresma, por exemplo, influencia as pessoas a deixarem de consumir carne vermelha por um período, aumentando a procura pelos ovos”, diz Felippe Serigati, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
O mercado já está acostumado com o aumento do consumo de ovos durante este período, porém os outros fatores colaboraram para uma falta do produto e, consequentemente, para o aumento dos preços.
O professor Ivan Salomão acrescenta ainda outros fatores sazonais, como retorno às aulas escolares e a realocação da produção de ovos, que também impactam o valor do produto.
Preço da carne
Há muito tempo a carne vermelha é um produto encarecido pela inflação. O seu preço também pode ser considerado um fator extra para o aumento da demanda por ovos. Com os preços da carne inflacionados por um longo período, muitas famílias passaram a substituí-la por ovos.
“Há 20 anos, o preço da carne é inflacionado. Isso faz o mercado escolher os ovos como alternativa para fonte de proteína no dia a dia”, afirma Ivan Salomão.
Clima no Brasil
Segundo Felippe Serigati, a crise dos ovos no Brasil passa por fatores como altas temperaturas e aumento no preço do milho (alimento das galinhas produtoras).
“Os fatores climáticos afetam diretamente a produção das galinhas nas granjas, além da elevação do preço do milho, resultando no encarecimento das rações para o setor granjeiro e atingindo diretamente o preço final do produto”, diz Serigati.
Fiscalização
Para fiscalizar e proteger as granjas do Brasil de possíveis surtos, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) inspeciona os produtores de ovos no país. Segundo o economista Caio Augusto, a fiscalização é a principal diferença entre as granjas brasileiras e as norte-americanas.
Ainda que exista o risco de contaminação por surtos, como de gripe aviária, as chances são menores devido ao trabalho de prevenção realizado pela vigilância sanitária brasileira.
“Existe risco no Brasil, mas é muito menor do que nos EUA. Isso acontece porque os padrões sanitários colocados pelo Ministério da Agricultura há décadas são reverenciados pelo mundo. Por aqui, para se ter uma ideia, uma granja inteira com 30 mil aves precisa abater todos os animais caso seja verificado que um deles está com gripe aviária, para evitar que a contaminação se espalhe”.
O especialista afirma que certos padrões sanitários não são aplicados nos Estados Unidos, o que torna o produto mais suscetível a possíveis surtos.